Pós-ditadura: Assembleia se consolida como espaço dos grandes debates
Se a falta de uma democracia de massas tornou o Legislativo catarinense vulnerável a interrupções desde os seus primórdios, é com a redemocratização e a promulgação da Constituição Federal de 1988 que o Parlamento estadual se consolida como o espaço para os grandes debates dos temas que interessam a Santa Catarina. Essa é a avaliação do professor do Departamento de Sociologia e Ciência Política da UFSC, Jacques Mick, ao analisar a trajetória de 180 anos da Assembleia Legislativa.
“A importância da Assembleia cresce à medida que a democracia se fortalece, que se torna de fato uma democracia de massas. E isso só se consolidou nos últimos 25 anos”, afirma o professor. O crescimento populacional, a ampliação do número de eleitores (universalização do voto), a transformação do país de uma sociedade rural para urbana, aliados à redemocratização durante a década de 80 do século passado, explicam, na avaliação do professor, a consolidação da democracia de massas no Brasil.
Mick considera que o Parlamento estadual deu sua contribuição para esse processo. “A Assembleia consolidou progressos, resultados de uma combinação de parlamentares de várias frentes partidárias, em um processo de interação cada vez maior com a sociedade, por meio de audiências públicas, contato constante com os eleitores, a criação de uma Escola do Legislativo, por exemplo”.
O papel do Legislativo em episódios como a Constituição Estadual de 1989, a intermediação de greves de servidores públicos, o processo de impeachment do então governador Paulo Afonso, a criação de código ambiental estadual, também contribuíram significativamente para a consolidação do Parlamento catarinense. “Uma das principais funções do Legislativo, além de votar leis que vão contribuir com a vida das pessoas, é operar como agente de fiscalização e debate. E, às vezes, a melhor coisa que a Assembleia pode fazer é ser um espaço para esse debate”.
Já para o historiador Reinaldo Rodolfo Lohn, é ainda durante a Ditadura Militar 1964-1985 que a Assembleia Legislativa começa a se tornar um poder mais relevante, principalmente após a segunda metade da década de 70, com a eleição de mais deputados da oposição. “Aos poucos, o número de deputados estaduais da oposição, alguns bastante combativos, vai aumentar. Com deputados que não se curvavam com tanta facilidade ao Executivo, o Poder Legislativo vai ganhar um pouco mais de autonomia. Só então começamos a ver um Legislativo um pouco mais relevante, mesmo ainda durante a ditadura”, comenta.
Abrigo
Servidora aposentada da Diretoria de Comunicação Social da Assembleia, Jamile Machado foi, por mais de 30 anos, um dos principais elos entre a imprensa catarinense e o Parlamento. Nomeada em 1973 para a função de datilógrafa, ela acompanhou a consolidação do Legislativo como causa e consequência da democracia de massas.
Mesmo no período da Ditadura Militar, segundo Jamile, apesar das restrições, a Assembleia foi espaço para o debate de ideias. “O Poder Legislativo sempre foi muito aberto a todas as categorias, aos sindicatos, associações de classe, federações. Sempre foi o abrigo das pessoas que não tinham muita voz, principalmente na época da ditadura”, comenta.
Com a redemocratização, em especial após a promulgação da Constituição, Jamile presenciou, também, o aumento na participação popular nas decisões do Parlamento. Antes, segundo ela, o público era formado basicamente por autoridades, o que mudou principalmente após a promulgação da Constituição Federal e da Estadual. “As pessoas começaram a se organizar, a frequentar mais a Assembleia. Aqui virou o ponto de encontro de quem passou a ter voz, mas não tinha o poder. As pessoas perceberam que poderiam reivindicar mais”.
Busca pela transparência
Para Jacques Mick, o Parlamento catarinense tem se empenhado para tentar superar alguns limites comuns da relação entre deputados e seus eleitores, como o distanciamento entre eleito e eleitor, o embate entre democracia representativa e democracia participativa e a prestação de contas do trabalho dos parlamentares.
“A Assembleia é dos poderes de Santa Catarina o mais aberto às reivindicações da sociedade e o que abriga de forma mais democrática a diferença crescente que se observa na sociedade catarinense”, considera.
Nesse sentido, outro aspecto importante é o que Mick chama de “esforço na prestação de contas”. Ele destaca os investimentos feitos nos últimos anos nos veículos de comunicação da Assembleia, visando dar mais visibilidade aos trabalhos legislativos. No entanto, o professor ressalta que esse esforço produz um efeito paradoxal. “Como ele [Legislativo] é o mais transparente dos poderes, ele é também o mais criticável dos poderes”, lembra.
Especial Parlamento 180 anos
Nesta sexta-feira (1º), a Agência AL conta como são feitos os retratos da galeria de ex-presidentes da Assembleia. (colaborou Nara Cordeiro, da Rádio AL)
Agência AL