Os 60 anos de voluntariado da Rede Feminina Estadual de Combate ao Câncer
Só quem já perdeu um parente ou algum conhecido para o câncer pode compreender a importância do trabalho das mais 4 mil voluntárias que atuam nas 71 redes feminina de combate ao câncer no estado. Elas foram homenageadas pela Assembleia Legislativa na sexta-feira (15), pelos 60 anos de atuação, em Cunha Porã, com a presença de 14 municípios do Oeste catarinense. A entidade atua fortemente na prevenção e orientação as mulheres na luta contra o câncer de mama e do colo de útero.
A Rede Feminina de Combate ao Câncer iniciou suas atividades em Santa Catarina em 6 de maio de 1961, com o objetivo de atender, por meio de um grupo de voluntárias, mulheres vítimas da doença e internadas. Desde então, vem prestando relevante trabalho e mostrando a todos a importância da prevenção do câncer, principalmente do colo de útero e de mama. A primeira unidade foi criada em Florianópolis e logo em seguida em Blumenau. Atualmente, a rede atua em 71 municípios, nos quais as voluntárias são responsáveis por cerca de 100 mil atendimentos a cada ano.
As ações, com foco na prevenção e combate aos cânceres de mama e colo de útero, incluem palestras informativas, oficinas, reiki, sessões de fisioterapia, bem como oferta de lenços, perucas, chapéus, próteses mamárias, entre outras, totalmente gratuitas e abertas ao público. “A Rede Feminina não concorre com o poder público, apenas soma esforços e firma parcerias para atender, de forma humanizada, as pacientes”, destaca a presidente estadual da Rede Feminina Estadual de Combate ao Câncer (RFECC), Maria Círia Zunino.
Os recursos para a manutenção da rede provêm de doações públicas e privadas, bem como de das voluntárias e da realização de eventos. “Nossas milhares de voluntárias estão presentes nos mais diferentes setores, nas linhas de frente da área da saúde, e travam verdadeiras batalhas para angariar recursos e garantir a qualidade nos serviços ofertados”, explicou a presidente da rede. Ela destacou ainda as parcerias com o poder público por meio de subvenções sociais e convênios. “Nós do terceiro setor não temos recursos próprios, por isso dependemos destas ações e apoios para conseguir trabalhar.”
Braço da saúde pública
Maria Círia Zunino enfatiza a importância da RFECC em prol das famílias catarinenses. “O trabalho da rede de voluntárias é um diferencial muito grande na saúde pública pelo acolhimento e pela atenção que elas dão as essas mulheres. Elas ficam muito vulneráveis quando são diagnosticadas e precisam de atenção, aconchego.” Para a presidente, o trabalho das mais de 4 mil voluntárias das redes femininas nos municípios é um braço da saúde pública.
“O nosso sentimento é de gratidão pela nossa saúde, a nossa vida é um presente de Deus e temos que agradecer a cada momento. Como presidente da RFECC, tenho muito gratidão a todas voluntárias.” Ela enaltece ainda que a rede é formada por voluntárias de todas as idades, pessoas de fibra, sempre batalhadoras e abnegadas em servir a sociedade catarinense por meio da causa comum de coordenar e cumprir ações de combate e prevenção ao câncer. Os 60 anos da Rede Feminina de Combate ao Câncer em Santa Catarina são uma marca no legado deixado pelas voluntárias, na opinião da presidente.
A importância da prevenção
O mastologista e voluntário da Rede Feminina de Combate ao Câncer em Florianópolis, Carlos Breda, explica que o câncer de mama é a doença mais prevalente no sexo feminino em termos de câncer e é o segundo tipo que mais acomete as brasileiras, representando em torno de 25% de todos os cânceres que afetam o sexo feminino. O câncer de mama só fica atrás do câncer de pele não melanoma. “São estimados 60 mil novos casos no Brasil por ano e cerca de 2 milhões de casos no mundo todo, por isso o diagnóstico precoce é importante no sentido de oferecer a essa paciente tratamento mais efetivo, cirurgias menos agressivas e maiores chances de cura.”
Ele destacou ainda que de acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer de mama é uma doença rara em mulheres jovens e sua incidência começa a ser mais expressiva a partir dos 40 anos. Em 2019, a taxa de mortalidade por câncer de mama, ajustada pela população mundial, foi de mais de 14 óbitos por 100 mil mulheres. Para 2021, o Inca estima 66.280 novos casos de câncer de mama, o que representa uma taxa de incidência de 43,74 casos por 100.000 mulheres. A incidência do câncer de mama tende a crescer progressivamente a partir dos 40 anos, assim como a mortalidade por essa neoplasia.
Para Carlos Breda, o trabalho das voluntárias da Rede Feminina de Combate ao Câncer tem um papel histórico no diagnóstico precoce do câncer de mama e do colo de útero, auxiliando as pacientes, estendendo as mãos à população mais desassistida e atuando em 71 municípios catarinenses.
Jornalista Carmem Prudente fundou a Rede Feminina em 1912
A criação da Rede Feminina de Combate ao Câncer no Brasil se deve à jornalista Carmen Revoredo Annes Dias, depois conhecida como Carmem Prudente, nascida em Porto Alegre (RS), em 25 de dezembro de 1912, filha de Heitor Annes Dias, médico pessoal do ex-presidente da República, Getúlio Vargas. O interesse de Carmen pelo câncer começou em 1938 quando casou com o médico oncologista Antônio Prudente, neto do ex-presidente Prudente de Morais, em São Paulo. Ela inicialmente fundou uma associação para tratar destas mulheres, depois criou a rede feminina.
Carmen trabalhou na Associação Paulista de Combate ao Câncer, onde iniciou sua dedicação ao voluntariado. Em 1946, junto com algumas amigas, fundou a Rede Feminina de Combate ao Câncer de São Paulo, que logo começou receber importantes doações em materiais, dinheiro e alimentos, atraindo a participação de muitas outras voluntárias. O crescimento da atividade e dos donativos permitiu que Carmen e Antônio fundassem em 1953 o Hospital do Câncer, que ela veio a dirigir após a morte do marido em 1965.
Atualmente a rede está presente em centenas de municípios nos 27 estados do Brasil, agregando uma legião de voluntárias. O movimento organizou as primeiras campanhas nacionais de esclarecimentos sobre a doença, ajudando a dissipar o antigo estigma que a cercava, um serviço de informação se mantém até hoje. Além de trabalhar na prevenção da doença, a rede dá assistência psicológica e auxílio material a pacientes carentes, viabilizando exames, consultas, medicamentos e procedimentos cirúrgicos, apoia e faz parcerias com iniciativas de outras instituições e do governo em suas várias instâncias.
Rede Feminina de Santa Catarina atua em 71 municípios
A Rede Feminina de Combate ao Câncer de Santa Catarina foi criada em 6 de maio de 1961, na capital catarinense, pela voluntária Iná Tavares Moellmann, que ocupou o cargo por quase 20 anos, a convite da fundadora e presidente nacional, Carmen Prudente. Inicialmente, as voluntárias atendiam as mulheres acometidas de câncer nos hospitais. Após 12 anos de existência em Florianópolis surgiu a primeira unidade no interior do estado, na cidade de Blumenau.
Com a demanda apresentada, outras redes foram sendo criadas, sempre fiéis ao propósito da entidade, proteger a mulher, orientando-a no sentido de prevenir o câncer. O alerta à prevenção do câncer de colo de útero e de mama vem sendo feito por meio de palestras de conscientização e panfletagens para grupos de mulheres e população em geral.
Atualmente 71 municípios contam com as redes femininas. As mulheres são atendidas por voluntárias, que atuam principalmente na prevenção do câncer de mama, com encaminhamento para mamografia e exame preventivo de câncer de colo uterino, o Papanicolau. O serviço proporcionam às usuárias terapias complementares ao tratamento e qualidade de vida, principalmente às mulheres mastectomizadas (que tiveram o seio retirado cirurgicamente).
Para um atendimento de qualidade, a maioria das redes possui sede própria, contando com o atendimento de enfermeiras, médicos, terapeutas e voluntárias. Em média, são realizados 100 mil atendimentos anualmente, reduzindo os índices de mortalidade no estado.
Homenagem justa às voluntárias da Rede Feminina
Para o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Mauro de Nadal (MDB), nada mais justo que homenagear a Rede Feminina de Combate ao Câncer quando Santa Catarina festeja os 60 anos de existência, com atuação em 71 municípios, 15 na região Oeste. O presidente destacou a coragem das mais de 4 mil voluntárias. “Falo em coragem porque a atividade solidária que move a rede envolve planejamento, determinação, abnegação e renúncias pessoais, o que só acontece com quem se move com arrojo, sem medo de enfrentar desafios.”
Mauro de Nadal complementou que essas qualidades são peculiares às mulheres. “Embora a coragem usualmente seja atribuída aos homens, desde o ato de ser mãe, gerar um ser, até o enfrentamento cotidiano às discriminações para galgar merecidos espaços na sociedade, a mulher faz sua história pessoal com a força de quem pode superar obstáculos e tem o entendimento de que o coletivo só avança em harmonia. Esse é o espírito que se impõe a partir da família e se transfere às melhores iniciativas de cunho social, como é o caso do trabalho desenvolvido pela Rede Feminina de Combate ao Câncer.”
O deputado foi o proponente da sessão solene, realizada em Cunha Porã, em homenagem aos 60 anos da RFECC. A rede de Cunha Porã foi criada em 2001, período em que ele foi prefeito do município. “Para ampliar sua atuação, a rede organiza palestras, busca atingir grupos de mulheres e a população em geral, de casa a casa, nas unidades de saúde, associações de bairros – ou seja, faz inúmeras campanhas. Estabelece parcerias com o comércio, promove bazar de roupas e objetos, incentiva a prevenção e realização de exames. É um trabalho de formiguinhas, que vocês mulheres da rede realizam em nossos municípios para ajudar quem precisa de apoio, para informar outras mulheres da importância de se cuidar. Isso faz enorme diferença na sociedade.”
“Ser voluntária é ter amor para dar”
Para a presidente da RFCC de Florianópolis, Zita Sander de Meireles, ser voluntária é ter amor para dar àqueles que mais precisam. “Uma voluntária precisa ter muito amor para dar e muita disponibilidade para atender as pessoas e estar presente para atender a mulher que nos procura. Às vezes não é por ter um problema de câncer, mas para fazer um preventivo, que é muito importante para combater o câncer.”
Ela explica que entidade está sempre querendo ter mais voluntárias com capacidade e amor ao próximo. “A voluntária quando chega é entrevistada para saber se está apta.” Em Florianópolis, depois da entrevista, a voluntária trabalha três meses para saber se pretende permanecer. Em seguida, assina um termo como voluntária. “Após um ano ou dois anos, dependendo do caso, se ela não faltou, faz o juramento e somente a partir deste momento começa a utilizar o uniforme de gala.”
Aumento de casos após a pandemia
A pandemia do novo coronavírus também afetou a atuação da Rede Feminina, que teve muitas atividades paralisadas em 2020 e que agora retorna com acúmulo de casos, de acordo com a enfermeira da Rede Feminina de Combate ao Câncer de Florianópolis, Cristiane Crescêncio Curtius. Devido à pandemia, a assistência ficou um “pouco esquecida”, por isso houve aumento de casos de câncer de mama e de colo de útero. “De um ano para outro pode ocorrer aumentos de casos e neste período pode ter alteração para as mulheres.”
Cristiane salienta que as voluntárias da rede ficam felizes que as pacientes estejam retornando em busca de exames, mas há a preocupação com o atendimento nos postos de saúde, que ainda estão focados no atendimento da Covid-19. Ela reforça a preocupação com o autoexame e a busca das mulheres pelo trabalho das voluntárias da rede. “É muito importante esse preventivo, a importância da rede é para mostrar que o câncer não é um bicho de sete cabeças, que elas não estão sozinhas e que com o tratamento correto tem como curar.”
São Carlos realiza 45 exames mensais
Uma das fundadoras da Rede Feminina de Combate ao Câncer em São Carlos, a vereadora Tiani Marschall Sacker lembra que em 2007 a entidade era regional, mas com a decisão de ampliar o atendimento nos demais municípios da região a entidade está focada em atender os casos locais. Atualmente são cerca de 40 voluntárias que realizam em torno de 45 coletas para exames por mês.
Em São Carlos, atualmente há cerca de 30 mulheres com câncer no município. “Os números de câncer tem aumentado bastante em nossa cidade, mas a maioria é devido às mulheres estarem mais atentas e realizando exames preventivos. Antes, elas não faziam os exames e muitas vezes chegavam mulheres com mais de 60 anos que nunca fizeram os exames preventivos.”
Para Tiani, ser voluntária é “muito gratificante. Além de dar muito amor à gente recebe amor”. “É uma alegria fazer parte desta história de 60 anos da rede no estado, estamos há 14 anos na nossa cidade e é uma semente plantada que continua dando frutos.”
Exames preventivos aumentaram em Cunha Porã
A RFCC de Cunha Porã foi fundada oficialmente em 2001, mas antes já havia voluntárias trabalhando. “Ser voluntária da rede é acreditar neste trabalho, de se doar, ter a consciência de que você é capaz de tornar esse mundo melhor. Voluntária deve estender a mão, deve proporcionar sorrisos a pessoas desmotivadas devido à dor, pelo sofrimento. Elas são as mãos amigas, por isso sou voluntária”, disse Adeli Jahnel Naue, uma das fundadoras, ex-presidente e atual tesoureira da rede em Cunha Porã.
A entidade conta com aproximadamente 25 voluntárias e atende de 80 a 100 mulheres por mês. “A rede começou a trabalhar em 1998, quando começamos a promover campanhas, visitar famílias, escolas, clubes e convidando as mulheres a se engajarem na entidade, mas somente em 2001 é que foi oficializada a rede no nosso município”, relembra.
Para Adeli, a importância do trabalho das voluntárias pode ser percebida no fato de que antes das campanhas da entidade muitas mulheres não faziam exames preventivos e agora a maioria está consciente destes autoexames. Ele conta que neste ano a entidade promoveu uma campanha para adquirir um aparelho de ultrassom e conquistou dois, um por meio de emenda parlamentar do deputado Mauro de Nadal e outro por decisão da prefeita, Luzia Vacarin (PSDB), que vai disponibilizar ainda uma sala e um médico ginecologista na secretaria da saúde para atender as mulheres.
Autoexame ajudou a diagnosticar caso
O apoio da Rede Feminina foi fundamental para ajudar a secretária Graziela Ventura Medeiros, 40, na luta contra o câncer de mama. Ela contou que a indicação de ultrassom ou mamografia é para mulheres a partir dos 40, por isso ela nunca tinha procurado um médico, mas sempre fazia o autoexame. Em julho deste ano, percebeu um caroço e fez um ultrassom. Deu carcinoma grau 5, que significa mais de 90% de chance de ser câncer, o que foi confirmado pela biópsia. Agora, ela vai fazer três sessões de quimioterapia no Centro de Pesquisas Oncológicas (Cepon) e depois a cirurgia. Na sequência, ainda seguirá o tratamento, com radioterapia.
“Descobri no final de julho, em autoexame, e procurei ajuda da RFCC de Florianópolis. Senti que a mama estava diferente, fiz ultrassom e depois fiz contato com elas, que me acolheram, e me deram explicações. Sabia do trabalho delas, procurei a rede para me ajudar, estava sem rumo. Aqui me acolheram muito bem, foram muito humanas comigo. Na mesma semana fiz exame, consegui médico para fazer atendimento, me agendaram outros exames que precisava. Foram ótimas comigo.”
Para Graziela, esse acolhimento é imprescindível. “A rede é muita humana e quero levar elas para minha vida, quero ser voluntária também, ajudar quem me ajudou. O autoexame é necessário, tem que procurar a prevenção, melhor prevenir do que remediar.”
Depoimentos
A auxiliar de serviços gerais Gleycy Oliveira procurou a Rede Feminina de Florianópolis pela primeira vez e teve uma ótima experiência. “Fui indicada por uma amiga que foi bem atendida. No posto saúde há muita fila e aqui é mais tranquilo. No posto teria que aguardar a consulta. Aqui o atendimento foi rápido, tirei minhas dúvidas.” Ela garante que vai continuar a fazer os autoexames e sempre que possível fazer as consultas na rede. “A prevenção é importante para todas as mulheres e é bom sempre estar se consultando.”
A faxineira e paciente da Rede de Florianópolis, Valdiva Otacília da Silva, que esteve pela quarta vez no atendimento, destaca a atenção e carinho dado a todas as pacientes. “É a quarta vez que venho aqui e o acolhimento é bom, somos bem recebidas. Não que os postos de saúde não atendam, mas aqui o atendimento é diferenciado, há mais informações, esclarecimentos, são atenciosas e o paciente é prioridade para elas.” Valdiva lembra que em 2010 esteve na Rede e foi diagnosticada. “Se não tivesse procurado, talvez não estivesse aqui. Fui tratada e tudo correu bem, graças a Deus.”
“Sempre admirei o trabalho voluntário, sempre pensava que quando fosse me aposentar seria uma voluntária e agora sou, e é bom ser voluntária. No início pensava que iria ajudar, mas acaba que elas nos ajudam”, diz a voluntária da RFCC de Florianópolis, Elizabeth Carreirão. Assistente social de profissão, ela já estava acostumada a trabalhar com o público e agora como voluntária da RFCC presta orientação e encaminhamentos para as pacientes. “A Rede é um local para ajudar a prevenir a saúde das mulheres e é muito importante o atendimento preventivo. Ser voluntária para mim representa a vida.”