Entidades pedem retirada das MPs da segurança pública durante audiência na Alesc
Profissionais das diversas categorias da segurança pública lotaram o Plenário Osni Régis, da Assembleia Legislativa, na manhã desta quarta-feira (2), para debater as Medidas Provisórias (MPs) 201, 202 e 203, de 2015, de autoria do governo do Estado, que alteram a jornada de trabalho e banco de horas, no âmbito das polícias civil e militar, bombeiros e Instituto Geral de Perícias (IGP). Durante a audiência pública, promovida pela Comissão de Finanças e Tributação, parlamentares e representantes das entidades pediram a continuidade das negociações com o governo e a retirada das MPs.
O presidente da Associação dos Praças de Santa Catarina (Aprasc), cabo Elizandro Lotin de Sousa, disse que a MP 202, que atinge a polícia militar e os bombeiros militares, causou surpresa e desânimo porque retirou a indenização (uma espécie de gratificação) nos períodos de afastamento por problemas de saúde e licença-prêmio. Para ele, a indenização é uma recompensa por conta do esforço no dia a dia. “Esse subsídio compensa a periculosidade da profissão.” Lotin apontou ainda a instituição da escala de 24hx48h, que fará com que bombeiros e policiais rodoviários estaduais trabalhem 240 horas por mês. “É o mesmo que trabalhar 8 horas por dia durante 30 dias. Isso é impossível aceitar, essa escala precisa ser retirada e substituída por uma jornada de trabalho digna.”
Santa Catarina tem os melhores índices de segurança pública no Brasil, com o quarto pior efetivo em relação ao total de habitantes, de acordo com o major Wallace Carpes, da Associação dos Oficiais Militares (Acors). Ele questionou a legalidade da MP 202. “Os militares só podem ter seu regime jurídico alterado por lei complementar. O conteúdo trata da retirada de direitos estatutários, revoga parte da Lei Complementar 614 e provoca redução salarial. É um retrocesso em relação ao que foi negociado quando da implementação do subsídio, em 2014”, argumentou.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Policiais Civis, Anderson Vieira Amorim, um policial com câncer está retornando ao trabalho hoje porque foi cortada de sua folha de pagamento a gratificação, que o ajudava a custear o tratamento. “Cortar a indenização de policial afastado por problema de saúde é desumano”, opinou o dirigente.
O presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil, Ulisses Gabriel, complementou que entre a categoria há afastamentos por cardiopatia grave, câncer e AVC. Todos esses profissionais tiveram a indenização, “que é uma espécie de recompensa pelo trabalho árduo e diuturno”, cortada. O benefício também foi suspenso para mulheres em licença-maternidade, durante as férias, licença-prêmio e no recebimento do 13º salário. Já o presidente da Associação dos Escrivães de Polícia, Paulo Roberto Cardoso de Andrade, pontuou a regulamentação do sobreaviso em horas excessivas. Segundo ele, “os escrivães têm uma sobrecarga de trabalho muito grande. O sobreaviso representa, na prática, uma dupla jornada de trabalho, que cerceia o direito ao descanso e ao lazer”.
O que diz o governo
O secretário de Estado da Fazenda, Antônio Gavazzoni, iniciou sua fala fazendo um retrospecto das políticas salariais voltadas ao setor de segurança pública desde 2003, quando vigorava a Lei 254. Ele afirmou que o atual modelo remuneratório, que tem por base o pagamento de subsídio e indenização, foi construído com a participação das entidades de classe e vem garantindo, todos os anos, aumentos reais para a categoria. Também foi derrubado o teto remuneratório para os inativos.
Com isto, disse, somente nos últimos quatro anos, a folha salarial da Segurança Pública aumentou de R$ 1,2 bilhão para 2,5 bilhões. “Esses números representam um incremento de mais de 100%, dentro de nossa opção de resgate da política efetuada na década passada, marcada pelo conflito e desmotivação e que não serviu nem para os policiais, nem para o governo e muito menos para a sociedade.”
A retirada da indenização em períodos de licença, entretanto, obedece a um esforço da pasta em baixar o percentual de comprometimento das receitas do Estado com o funcionalismo (hoje em 50%), e leva em conta a isonomia com as demais categorias públicas, que não recebem o benefício. Ele garantiu, entretanto, que a medida não acarretará perdas para o setor e que o pagamento da indenização será mantido nos casos em que o servidor estiver impossibilitado de atuar em virtude de ação decorrente do serviço. “Não estamos fazendo isso para que nenhum servidor tenha a remuneração menor do que é agora. Ao contrário, será maior.”
Outro motivo alegado para a edição das MPs, cujos efeitos retroagem a 1º de agosto, foi estancar o número de processos movidos contra o governo pela falta de regulamentação no cumprimento de horas-extras. “O governo também foi surpreendido em inúmeras ações judiciais, individuais e coletivas, que visam destruir todo esse modelo construído. Se ele acabar, poderemos retroagir à Lei 254, que prometia o céu e se entregava o inferno.”
Gavazzoni afirmou ainda que o Executivo mantém o diálogo aberto com as entidades de classe e não descarta eventuais alterações nos textos. “O Parlamento tem o tempo e a capacidade de examinar as matérias e o governo seguirá ouvindo e acompanhando o debate para que possamos avançar.”
O secretário de Estado da Segurança Pública, Cesar Grubba, por sua vez, discorreu sobre as iniciativas para prover o estado de mais efetivos policiais, como a nomeação de 5.049 novos servidores desde 2011. “Este número representa cerca de 25% do atual quadro do setor, próximo de 18 mil profissionais”, disse. Outros mil novos servidores, entre policiais militares, civis e delegados, também devem ser nomeados até o final do ano.
Com relação à estrutura física, disse, a secretaria vem investindo na construção e reforma de 1.015 unidades policiais instaladas pelo estado e de um complexo para a segurança pública que vai abrigar todos os órgãos ligados à pasta. A ação deve possibilitar uma economia de R$ 500 mil em aluguéis.
A opinião dos deputados
Luciane Carminatti (PT) apontou que há vício formal nas medidas provisórias editadas pelo governo. Ela questionou o corte da indenização nos afastamentos de saúde e na licença-maternidade, pedindo justiça e valorização dos profissionais. “As mulheres não poderão mais engravidar, ou serão castigadas durante a licença-maternidade”, frisou. A deputada defendeu que as MPs sejam retiradas.
Gean Loureiro (PMDB) salientou que a audiência pública marca a reabertura do diálogo entre as categorias, o governo e o Parlamento. Conforme o deputado, “a angústia é geral entre policiais civis e militares”. Ele também espera que as medidas provisórias sejam retiradas pelo governo para continuação do diálogo.
Natalino Lázare (PR) reconheceu a atuação dos profissionais da segurança pública e opinou que a solução é melhorar a distribuição dos recursos no país, com a alteração do pacto federativo. “Estados e municípios vivem um momento de penúria”, disse.
Dirceu Dresch (PT) frisou que a segurança pública é o mais difícil dos desafios entre as políticas públicas e que a responsabilidade do Estado é oferecer um serviço de qualidade. “Foi um equívoco apresentar essas alterações como medida provisória, deveriam ter vindo como projeto de lei complementar.”
Darci de Matos (PSD) afirmou que os pleitos são legítimos, mas que o governo precisa buscar uma alternativa viável para o estado. “Nós estamos tratando da questão salarial em um momento catastrófico, em que a arrecadação caiu de forma absurda.” Darci admitiu que sejam revistos alguns aspectos do texto governamental.
Fernando Coruja (PMDB) reforçou que o assunto não pode ser objeto de medida provisória, “que deve ser restrita para situações de urgência e relevância, que não é o caso”. Coruja levantou pontos que precisam ser ‘consertados’ e que ultrapassam a racionalidade econômica, caso da suspensão da gratificação durante a licença-maternidade e em casos de doenças graves.
Maurício Eskudlark (PSD) concordou com os pontos levantados por Fernando Coruja e reconheceu “os avanços conquistados com a melhoria da remuneração das carreiras, em especial na polícia civil, graças ao diálogo construído com o governo Colombo”.
Ana Paula Lima (PT) sugeriu que o governo economize extinguindo as Secretarias de Desenvolvimento Regional e retire as medidas provisórias para restabelecer o debate com as categorias. “Deram aumento em 2014, e agora retiram em 2015”, protestou.
O líder do governo, Silvio Dreveck (PP), rebateu pronunciamentos de colegas afirmando que haverá tempo para debater as medidas provisórias e que a forma como o assunto foi encaminhado não importa. “Temos que ter audácia e coragem de enfrentar os desafios não apenas com discurso, para não acontecer no futuro o que já aconteceu, com a suspensão do pagamento de salários”. Ele se comprometeu a fazer a ponte com o governo para atender algumas demandas levantadas na audiência.
Como relator das MPs na Comissão de Finanças, da qual é o presidente, Marcos Vieira (PSDB) informou que receberá emendas parlamentares até o dia 4 de setembro.
Alexandre Back e Lisandrea Costa