Alesc sedia debate sobre alterações no Estatuto do Jovem Aprendiz
FOTO: Solon Soares/Agência AL
A Assembleia Legislativa sediou um seminário que debateu o Projeto de Lei 6.461/2019, que institui o Estatuto do Jovem Aprendiz. O evento, realizado durante a manhã desta segunda-feira (7), foi solicitado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, que está debatendo a legislação válida para todo o Brasil.
De acordo com o deputado federal Pedro Uczai (PT), vice-presidente da comissão na Câmara, o colegiado está realizando seminários em todos os estados para colher sugestões antes de finalizar o debate interno no Congresso. “Discutir isso é definir o futuro das gerações. É um processo democrático e o Parlamento é o espaço mais democrático para ouvir, debater e construir a legislação, que pode servir para cinco, dez, quinze, trinta anos. Ao pensar o mundo dos adolescentes de 14 anos até os jovens de 24 anos, além das pessoas com deficiência, nós estamos pensando que Brasil a gente quer”, argumentou.
Ao final do evento, Uczai convidou os participantes para participar das audiências públicas que serão realizadas no Congresso Nacional enviando sugestões de aprimoramento da matéria. “É importante que todas as entidades aqui possam ir à Brasília agendar audiências com os integrantes da comissão, principalmente o relator [deputado federal Marco Bertaiolli (PSD-SP)]”, citou.
O deputado sugeriu ainda que novos debates sejam promovidos virtualmente com os alunos das instituições de ensino no período noturno para que os jovens e adolescentes possam expor suas opiniões. A meta da comissão é concluir os seminários até abril e, entre maio e junho, votar a proposta para, em seguida, passar pelo Senado.
Engajamento
Primeiro a falar no seminário realizado na Alesc, Luiz Carlos Floriani, presidente do Conselho Administrativo do Ciee, destacou que as discussões sobre a aprendizagem para jovens e adolescentes “vêm de muitos anos”. Ele alertou que, em muitos momentos, “o setor produtivo se coloca contra determinadas situações”, entendendo como despesa o processo de oferecer vagas para este público.
“Chamo a atenção dos empresários e eu também sou empresário. É fundamental que se quebre esse paradigma de se ver tudo como despesa. Vivemos no mundo um novo momento, que exige o engajamento de todos. Se o Ciee está aqui, é porque estamos preocupados, pois mesmo que tenhamos uma legislação que obriga o empresariado a ter cota de aprendizes, não temos um terço do que poderíamos ter de jovens e adolescentes sendo qualificados”, afirmou.
Na opinião dele, é uma oportunidade de treinar profissionais com a filosofia da empresa. “Não é custo, é investimento. Já entendi a importância de qualificar a mão de obra não só no aspecto financeiro, como definitivamente da importância do nosso papel na sociedade na inclusão das esferas menos favorecidas. Esta é responsabilidade de todos. Nós empresários precisamos reavaliar. Está na hora de discutirmos as soluções. É inadmissível um empresário ficar contra resolver uma situação social da sua própria cidade”, destacou.
Para Marcelo Goss Neves, procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina, além da profissionalização, o programa Jovem Aprendiz é “um direito a ter um caminho para uma vida melhor”. Segundo ele, é fundamental criar “um leque de conhecimentos” para o jovem, “principalmente o que vive em vulnerabilidade, para que ele tenha uma chance no futuro”.
O procurador disse que, do que já leu no projeto, o artigo quinto é muito relevante. “As normas da aprendizagem profissional não podem ser objeto de negociação coletiva, salvo condição mais favorável ao aprendiz. Isso parece insignificante, mas já me faz dar apoio total por parte do Ministério Público. É um ganho coletivo fabuloso. Pois, em algum momento, a criatividade jurídica alheia entendeu que poderia diminuir cotas de aprendizes em acordos coletivos. Tem que manter o formato de contrato de emprego, com todos os direitos, jornada reduzida, cuidado com trabalho insalubre, noturno, perigoso. Não pode perder o foco da essência da aprendizagem para evitar que o que se construiu até hoje seja desfeito”, explicou.
Luciana Xavier Sans de Carvalho, auditora fiscal do Trabalho em Santa Catarina e coordenadora nacional do Projeto de Inclusão no Estado, relatou que o início da justificativa do projeto “já diz tudo”. Ela concorda que o emprego de aprendiz muitas vezes é o primeiro contato de um adolescente ou de um jovem com o mundo do trabalho.
“E ele tem esse caráter também para quem tem 18 ou mais anos. Continua tendo um caráter especial, protegido, educativo, pois a gente tem pessoas com mais de 18 anos que estão tendo a primeira experiência. Santa Catarina pode, inclusive, impulsionar nossos empresários. Já foram apresentadas mais de 100 emendas [ao texto] e avalio que várias delas precisam ser aprovadas”, contou.
Uma crítica feita pela auditora foi sobre um ponto da matéria que sugere que empresas maiores contratem menos aprendizes. Para ela, isso deveria ser ao contrário, quanto maior a empresa, mais vagas. Outra crítica é sobre a possibilidade de o contrato durar quatro anos.
Princípio educativo
Evandro Belmiro da Silva, diretor de Assuntos Estudantis do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), defendeu o que considera “estruturante em qualquer debate sobre mudança de lei e de estruturação e qualificação” do programa Jovem Aprendiz: o princípio educativo.
“Essa forma de inserção socioprofissional dos jovens no mundo do trabalho deve ser vista como uma ação importante de qualificação dos projetos de cursos. É uma oportunidade para que os jovens façam uma articulação dos seus conhecimentos científicos, culturais e tecnológicos com a prática social. Não podemos perder de vista essa questão. Qualquer proposta que desvincule a matrícula em cursos da oportunidade de inserção socioprofissional, como foi cogitado, seria absurda”, comentou.
De acordo com Silva, o IFSC defende que todos os direitos trabalhistas sejam garantidos na legislação. A instituição, assegurou, é veementemente contrária a qualquer proposta que precarize essa realidade.
Sueli Aparecida, coordenadora de Relações do Mundo do Trabalho do IFSC, lembrou que a legislação foi criada para garantir uma infância e juventude livre de exploração do trabalho e garantir a permanência do jovem e adolescente na escola, com renda e qualificação profissional e condições de vulnerabilidade sanadas. “O trabalho deve estar protegido por políticas públicas, conversando com vários setores da sociedade”, citou.
Para ela, outros fatores devem ser levados em conta, como as diferenças regionais do público-alvo do programa, além de rever a matrícula da educação formal ser vinculada aos programas de aprendizagem. “Matrícula e frequência escolar são importantes também. Hoje as escolas não têm o controle de quem está no programa Jovem Aprendiz, quem não está, quem finalizou e o quê resultou”, lamentou.
Última esperança
João Luís de Carvalho de Botega, promotor do Ministério Público em Santa Catarina e presidente do Conselho do Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude, falou sobre outra parcela do público a quem o programa é voltado: jovens e crianças em situação de vulnerabilidade social e de violência “que vão para abrigos com seus 10 anos de idade e permanecem lá por outros motivos até seus 18 anos e saem sem nenhuma perspectiva de vida”. De acordo com ele, a aprendizagem para este grupo é esperança, “talvez a última”.
Segundo o promotor, há um potencial enorme de recolocar esses adolescentes com uma outra perspectiva de vida e futuro. “O MP tem buscado incentivar parcerias com diversos órgãos. Temos um programa de aprendizado próprio, com aprendizes que trabalham no Ministério. Sugiro incluir os órgãos públicos como obrigados a contratar jovens aprendizes. Precisamos dar exemplo também. E ainda conseguiríamos expandir muito a abrangência”, considerou.
Ângela Maria Konrath, juíza do Trabalho em Santa Catarina, por sua vez, assegurou que a Justiça do Trabalho tem compromisso com a aprendizagem profissional. “Nossa articulação nessa bandeira vem na toada da erradicação do trabalho infantil. A pessoa que está na adolescência vai ter a acesso a um trabalho remunerado, protegido e vai permanecer na escola. A gente vê como a melhor forma de erradicar o trabalho infantil”, contou.
De acordo com a magistrada, o engajamento do Judiciário no Estado vem sendo feito por meio de programas do Ministério do Trabalho. “Em Santa Catarina foi implantado um sistema de aprendizagem que nos deu um alívio de sobrecarga. Pois do que adianta dizer para as pessoas façam isso se a gente não está fazendo. É algo que vai ser expandido para todas as varas do Estado, no mínimo um aprendiz em cada local”, concluiu.