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Publicado em 08/09/2022

A cassação por “falta de decoro parlamentar” e a clandestinidade

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O deputado foi cassado em 9 de maio de 1964, dias após o início do Regime Militar; oficialmente, o motivo foi

Depois de abril de 1964, a Assembleia Legislativa, para demonstrar sua adesão ao novo regime e sob pressão da Marinha e da Secretaria de Segurança Pública, sentiu-se na obrigação de cassar o mandato político de algum deputado considerado subversivo. Como Paulo Wright não usava gravata e paletó quando subia à tribuna, acabou sendo cassado por “falta de decoro parlamentar”, em 9 de maio de 1964. O próprio PTB, partido do presidente da República deposto, votou a favor da cassação. Apenas Genir Destri e Antônio Pichetti votaram em defesa do deputado joaçabense. Em seguida, o conselho da Igreja Presbiteriana retirou-o do quadro de membros da congregação.

Depois de cassado
Fora da Alesc, Wright asilou-se no México, de onde voltou, clandestinamente, um ano depois. Começou então a sua militância clandestina como dirigente da AP. De acordo com documentos dos órgãos de segurança, foi o representante oficial dessa organização na reunião da Olas (Organização Latino-Americana de Solidariedade), realizada em Havana em agosto de 1967. Teria recebido treinamento militar tanto naquele país quanto em Pequim (China). Foi submetido a vários processos na Justiça Militar, recebendo algumas condenações. “Quando retorna ao Brasil em 1965 passa a viver clandestinamente com o uso de codinomes, são os últimos oitos anos da vida dele.”

Segundo o historiador Reinaldo Lohn, nesta época, Paulo Stuart vai atuar na direção da AP, participando de todos os debates e confrontos internos que envolvem os agrupamentos de esquerda desta época que passavam por decisões de como resistir à ditadura, que estratégias deveriam ter, que caminho tomar, se iriam tomar um caminho pacifico ou confronto armado.

Entre 1971 e 1972, ao lado do principal dirigente da AP, Jair Ferreira de Sá, alinhou-se com a ala dessa organização que se opôs à incorporação de seus militantes ao PCdoB, após uma longa disputa interna que culminou, em setembro de 1972, com a separação definitiva dos dois grupos. A chamada maioria foi incorporada ao PCdoB, entre eles o atual presidente do partido, Renato Rabelo, ao passo que Paulo Wright, Jair, Honestino Guimarães e outros militantes mantiveram-se na AP, já rebatizada como Ação Popular Marxista Leninista.

Desaparecimento
Nos primeiros dias de setembro de 1973, Wright foi sequestrado pelo II Exército e levado ao Doi-Codi de São Paulo, onde há suspeita que foi morto sob tortura nas primeiras 48 horas de cárcere. Segundo informações de Osvaldo Rocha, dentista, militante da APML na ocasião do desaparecimento de Paulo, ambos estavam juntos num trem que ia de São Paulo a Mauá, na Grande São Paulo. Nessa ocasião, ao terem percebido que eram seguidos por agentes da repressão política, Osvaldo desceu do trem em primeiro lugar e Paulo combinou que desceria em outro ponto.

Notícia do desaparecimento repercutiu nos EUA; Paulo Stuart tinha cidadania estadounidenseO professor da Udesc conta que a família do ex-deputado tomou inúmeras iniciativas para a solução do desaparecimento, inclusive recorreu ao Congresso dos Estados Unidos, que solicitou explicações. As autoridades brasileiras nunca confirmaram sua prisão e seu corpo até os dias de hoje não foi localizado. Oficialmente, está desaparecido desde 1º de setembro de 1973.

As autoridades brasileiras, na época, continuaram negando a prisão de Paulo, entendendo que se tratava de uma ingerência do governo norte-americano, porque ele havia sido deputado da Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Apesar de todos os esforços empreendidos pelos familiares, sua prisão nunca foi confirmada e seu corpo até hoje não foi encontrado. Sua ficha foi encontrada na gaveta dos arquivos secretos do Dops/PR que continha 17 militantes de oposição ao regime militar com a anotação de “falecidos”.

Símbolo da luta pelos Direitos Humanos
Com o desaparecimento de Paulo Stuart Wright, surge um grande símbolo da luta pelos Direitos Humanos no Brasil, o seu irmão, o pastor presbiteriano, Jaime Wright, que em outubro de 1975 é um dos co-celebrantes do culto ecumênico realizado na Catedral da Sé, em São Paulo, em protesto contra a morte sob tortura de Vladimir Herzog, e também um dos responsáveis pelo projeto “Brasil: Nunca Mais”, que propiciou profundo inventário das torturas e dos assassinatos perpetrados pelos porões do regime militar.

Os irmãos Paulo e Jaime Wright“O irmão mais velho, o reverendo Jaime, é o grande companheiro da vida dele, que tem papel significativo na preservação da memória dele, porque em função do desaparecimento dele vai procurar a Comissão de Justiça da Igreja Católica, em São Paulo, se torna aliado de dom Paulo Evaristo Arns, e vai viabilizar aquilo que se chamou posteriormente o projeto Brasil: Nunca Mais, que reúne documentos, provas, informações que comprovassem que a ditadura montou um aparato repressivo gigantesco que tomou todo estado brasileiro, que comprometeu o conjunto do estado brasileiro”, relembra Lohn.

Comissão de verdade
Com o trabalho da Comissão da Verdade, a partir de 2014, esse caso foi investigado e novas informações vieram à tona. “Ele segue sendo um símbolo do aparato repressivo em Santa Catarina. Não é o único caso, há outras vitimas de catarinenses que foram mortos, mas ele é o símbolo maior, é o grande nome dado à vinculação que ele tem, ele não é só um cidadão catarinense, circula pelo país, por todo continente, tem impacto internacional, está no centro do resgate da memória do país democrático”, diz Lohn.

“Um dos grandes legados dele é a denuncia de que o estado brasileiro foi palco de montagem de uma estrutura gigantesca, complexa de repreensão, que não foi uma coisa excepcional. Comprometeu o conjunto do estado, das forças armadas, a gente ainda está avaliando o desdobramento desta estrutura”, completa o professor.

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