Comissão avalia os 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente
Os avanços e desafios do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA/Lei Nº 8.069/90), que completou 30 anos de sua promulgação no dia 13 de julho, foram tema de reunião por videoconferência da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente na tarde desta quarta-feira (22). O encontro contou com a participação da juíza titular da Vara da Infância e Juventude da Comarca da Capital, Brigite Remor de Souza May.
Ela falou um pouco sobre início da efetivação do Estatuto nos anos 90. Segundo a juíza Brigite Remer de Souza May, o grande dilema era a diferenciação do atendimento do adolescente em conflito com a lei que não deveria ser mais tratado sob a ótima criminal, mas sob a ótica protetiva. Antes, o que valia era o código de menores que concentrava a repressão a crianças e adolescentes em situações vulneráveis.
Enfatizou que o ECA estabeleceu os direitos e deveres de garotos e garotas com menos de 18 anos, para os quais foram fixadas medidas especiais de proteção e assistência a serem executadas, conjuntamente, pela família, comunidade e Poder Público. Que o ECA veio completar os artigos 227 e 228 da Constituição Federal e que com ele o Brasil foi o primeiro país da América Latina a incorporar os direitos a defesa aos direitos das crianças e adolescentes.
A juíza também falou sobre a relação com a rede de proteção que resguarda os direitos das crianças e dos adolescentes, citando os desafios da relação com esses profissionais, como os conselheiros tutelares, promotores, juízes das Varas da Infância e Juventude. “Foi uma transformação profunda, que busca trazer a sociedade como responsável por esses jovens.”
Observou que o ECA também instituiu as medidas socioeducativas para os jovens que praticam crimes e são apreendidos. As punições vão desde advertência verbal até a internação, que deve ser regida por dois princípios: o da excepcionalidade e o da brevidade. O tempo da sentença tem prazo mínimo de seis meses e máximo de três anos.
Ela apresentou como principais dificuldades a falta de conhecimento que a maioria da população tem dos 277 artigos do ECA, que abordam diversos temas: desde autorização para viajar até proteção contra o trabalho infantil e tipificação de crimes. “Com o ECA, nós passamos a ver a criança como sujeita de direitos, com proteção integral, sempre as ações visando seu melhor interesse e com absoluta prioridade.”
Nostalgia
O deputado Ismael dos Santos (PSD) relatou que trabalhou na comissão que elaborou o ECA há 30 anos, em Brasília, e que neste período, por dois anos, atuou como secretário municipal da Criança e do Adolescente em Blumenau. Ele questionou a juíza Brigite Remer de Souza May de como conscientizar a população que o ECA não é uma legislação que premia a impunidade e que há penalidades aos jovens infratores.
A juíza salientou que o Estatuto é considerado um marco legal e regulatório dos direitos humanos de crianças e adolescentes e que sua meta é socializar os jovens. Disse que a Justiça tem aplicado várias medidas sócias educativas nos jovens infratores, observando que os jovens querem mais oportunidades, querem trabalhar e estudar. “A dificuldade existe por eles serem de famílias vulneráveis e as pessoas ainda terem medo, receio de darem oportunidade a esses adolescentes.”
Falou ainda que é importante o estado lembrar que esse jovem internado vai voltar para a sociedade. “A gente tem que buscar que esse jovem seja recolocado em condições de estar na sociedade, no mercado de trabalho, e não aprisioná-lo e achar que ele não vai voltar para essa sociedade.”
Ela falou também que é preciso que a população saiba diferenciar os jovens que estão em Casas de Acolhimento Provisório, por terem sofridos atos de violência, com jovens que cometeram atos de violência. “Há muito preconceito e todos precisam de oportunidade.”
Consequências
O deputado Jessé Lopes (PSL) afirmou ter uma posição clara quanto ao ECA, salientando que é importante trabalhar para cuidar das crianças e dos adolescentes, mas que não se pode deixar de punir aqueles que cometem crimes. Disse que muitas vezes não é falta de oportunidade que leva uma pessoa para o crime e sim a falta de caráter. “Tem certos crimes que não têm idade. Tem que ser punido e o jovem saber que vai arcar com as consequências de seus atos."
Brigite Remer de Souza May observou que a questão da impunidade é uma questão de política pública e que em sua opinião o ECA pune os jovens pelos seus atos, mas que há outras formas de punição que vão além da internação. Disse que a maioria dos atos de infração dos jovens no Brasil é referente ao tráfico de drogas, mas lembrou de que se ele vende drogas é por haver quem compre. Observou ainda que há um sistema socioeducativo superlotado e incapaz de proporcionar reabilitação adequada.
Violência familiar
O deputado Jair Miotto (PSC) questionou sobre o número crescente da violência sexual e verbal no meio das famílias contra as crianças e adolescentes. Indagou se não seria possível elaborar uma lei que permitisse o jovem agredido a denunciar a violência familiar. A juíza Brigite informou que já há vários mecanismos em defesa dos jovens e que deveriam ser mais conhecidos pela sociedade.
Reconheceu que o número da violência familiar tem crescido assustadoramente em todo o país e afirmou que a escola, os postos de saúde e os conselhos tutelares são parceiros fundamentais para denunciarem esses atos de violência contra as crianças e os adolescentes.
Conselhos tutelares
O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, deputado Sérgio Motta (Republicanos), defendeu que o ECA deva ser mais divulgado e que ele trouxe avanços a proteção das crianças e dos adolescentes. Informou que a próxima reunião da comissão, ainda em data a ser confirmada, será discutido a questão de apoio aos conselhos tutelares neste período de pandemia do Covid-19, atendendo um alerta da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, sobre a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) aos profissionais que atuam neste setor.