Audiência discute ações contra a demarcação dos terrenos de marinha
Ações judiciais, administrativas e legislativas, como a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em tramitação no Senado desde 2007, estão entre as medidas discutidas para o enfrentamento à demarcação dos terrenos de marinha em Florianópolis, tema de audiência pública realizada pela Comissão de Transportes e Desenvolvimento Urbano da Assembleia Legislativa, na noite desta terça-feira (5). Durante quase três horas, moradores de vários bairros da Capital, autoridades municipais, representantes do Judiciário, do Executivo estadual e da Superintendência do Patrimônio da União no Estado de Santa Catarina (SPU-SC) trataram do polêmico assunto, que tem causado indignação em moradores da Ilha de Santa Catarina e de outras regiões do estado.
A demarcação das terras de marinha foi iniciada pela SPU-SC em Florianópolis em 2005. O objetivo é localizar os imóveis com área constituída de faixa de 33 metros, a contar da linha preamar-média (LPM) de 1831 para dentro da terra, nas áreas banhadas por águas sujeitas à maré, conforme o artigo 2º do Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946. Todo o trabalho é regulado também por uma Orientação Normativa de 2003, do Ministério do Planejamento.
O processo, que já está prestes a ser concluído, deve atingir mais de 30 mil imóveis que ficam às margens do mar, de lagoas ou de mangues, apenas na Capital. A medida reconhece a União como proprietária desses imóveis e seus atuais ocupantes serão notificados a regularizarem a situação, além de pagarem taxas para a União referentes ao uso desses imóveis.
Críticas
As principais queixas apresentadas durante a audiência foram referentes aos estudos para a demarcação das terras feitas pela SPU-SC. Moradores de bairros como Carianos, Daniela e Saco Grande apontaram o que acreditam ser falhas nesses estudos. Para eles, faltou transparência da superintendência na disponibilização dos processos de demarcação para consulta pública. A superintendente substituta da SPU-SC, Tereza Godinho Alves, afirmou que todos os processos são públicos e explicou que os moradores terão condições de contestar as demarcações assim que forem notificados.
Outra queixa se refere ao prazo de dez dias para a apresentação das contestações à demarcação, contado a partir da notificação do proprietário do imóvel. “A SPU levou dez anos para fazer esses estudos e agora quer que o cidadão se defenda em apenas dez dias?”, questionou o vereador de Florianópolis Edson Lemos (PSDB), da comissão criada pela Câmara da Capital para acompanhar a demarcação.
Segundo Juliano Pinzetta, chefe da Coordenação de Identificação e Fiscalização da SPU, o órgão vai verificar junto ao seu departamento jurídico a possibilidade de ampliação do prazo de dez dias. Ele lembrou que, além desse primeiro recurso à SPU-SC, os notificados poderão recorrer à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) em Brasília e ao Ministério do Planejamento.
Metodologia
Os métodos utilizados pela SPU para a demarcação da LPM na Ilha de Santa Catarina foram contestados pelo engenheiro cartográfico Odébe Pereira de Lima, autor de uma tese de doutorado sobre as terras de marinha na Capital. Ele apontou seis itens da Orientação Normativa de 2003, as quais considerou equivocadas e que poderiam, portanto, tornar todo o processo da superintendência ilegal. Entre os itens contestados, está o uso da média arimética das máximas das marés para a definição da LPM ao invés da média das marés, o que alteraria significativamente a posição da linha.
Juliano Pinzetta explicou que a metodologia utilizada pela SPU-SC seguiu a legislação vigente. “Como servidores, nós temos que seguir o que está na lei”, explicou. “Se houve equívocos, vocês terão momento de contestá-los, e a LPM pode ser revista.”
A superintendente da SPU afirmou que levará os questionamentos feitos durante a audiência aos responsáveis pela Secretaria do Patrimônio da União em Brasília. “Todos que têm imóveis nas áreas demarcadas serão notificados pessoalmente para apresentarem suas contestações”, garantiu Tereza.
Ações
O prefeito de Florianópolis, Cesar Souza Junior, afirmou que o município ingressará com uma ação judicial, juntamente com Vitória (ES), para contestar a demarcação das terras de marinha na Capital, além de aguardar um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre um recurso que trata do tema. Ele também defendeu uma mobilização em prol da aprovação da PEC 53/2007, em tramitação no Senado, que acaba com os terrenos de marinha.
O subprocurador César Abreu, representante do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), acredita que a União não tenha mais direito a esses terrenos de marinha, uma vez que a Ilha de Santa Catarina deixou de ser propriedade da União para ser do município de Florianópolis. Ele também lembrou que os terrenos de marinha perderam sua função, pois esse expediente, quando foi criado, tinha como objetivo defender o território nacional de possíveis invasores estrangeiros.
Conforme o deputado João Amin (PP), presidente da Comissão de Transportes da Assembleia, o objetivo da audiência foi mobilizar a sociedade civil organizada e o poder público entorno do assunto. “Queremos ampliar esse debate, de forma democrática, informando a população sobre o que está ocorrendo. Não faltarão esforços da nossa comissão para que a população não seja lesada”, afirmou o parlamentar.
Participaram também da audiência a ex-prefeita de Florianópolis Angela Amin, os deputados Gean Loureiro (PMDB), Manoel Mota (PMDB), Cleiton Salvaro (PSB), Darci de Matos (PSD), Mário Marcondes (PR) e Leonel Pavan (PSDB), o prefeito de Balneário Rincão, Décio Góes (PT), vereadores de Florianópolis, Palhoça, Biguaçu e Governador Celso Ramos, além de representantes do Sinduscon, Crea, Ministério Público Estadual e do governo estadual.
Agência AL