Silvio Pleticos recebe homenagem da Assembleia Legislativa
Aos 92 anos, completados em 1º de maio, praticamente surdo – o que, segundo ele, o autoriza a falar somente o que lhe convém – e com grande perda olfativa, o artista italiano Silvio Pleticos, que vive no Brasil há 55 anos, recebeu homenagem do Legislativo catarinense na noite de quarta-feira (23).
Promovida por iniciativa da Mesa, a sessão especial foi presidida pelo deputado Leonel Pavan (PSDB). O parlamentar definiu como um orgulho para a Assembleia Legislativa e para todos os catarinenses homenagear uma pessoa que é exemplo de vida. “Silvio Pleticos se destaca como um exemplo de superação, pois sofreu desde criança os traumas da guerra, quando morava na Itália; passou fome, viveu em orfanato e, ao longo da vida, escolheu santa Catarina para viver. Aqui tornou-se um ídolo, um artista de destaque, um professor não só de artes, mas da vida. Essa homenagem é justíssima", afirmou Pavan.
Emocionado, Pleticos declarou que gostaria de emanar sua gratidão pela homenagem a todos os seus amigos e conhecidos. “Como artista ainda estou tentando buscar os últimos resultados do meu trabalho dando aula para qualquer tipo de principiante, mesmo adulto, que se interesse por arte. Santa Catarina merece muito mais do que eu pude dar. Espero que meus ex-alunos continuem no rumo, abrindo-se para todos aqueles que gostam de arte.”
O artista agradeceu a homenagem e comunicou que não tem o costume de se emocionar. E, como não poderia deixar de fazer, sendo que sempre o faz, estendeu a homenagem à sua esposa Lili Pleticos. “Não tenho o hábito de me comover, mas vou aproveitar para agradecer a uma criatura que me tirou do ponto mais crítico em que eu vivia para me acompanhar até, provavelmente, ao fim: minha esposa Lili.”
A fragilidade na área da cultura
Pleticos falou de seu amor pela pintura e de sua dedicação às artes nas 24 horas do dia. “Mesmo nos meus sonhos, estou ativo na arte. Me preocupa que o estado de Santa Catarina não seja destaque na Cultura como deveria ser, mas reconheço os avanços que já tivemos. Essa homenagem é um sinal de que o estado está reconhecendo a importância das artes e da cultura.”
Aos 92 anos, Pleticos informou aos presentes que gostaria de viver mais uns três ou quatro anos para continuar criando. “Gostaria de incluir certos princípios nos quais estou trabalhando para contribuir com o despertar da arte de forma mais prática na vida das pessoas e não tão teórica.”
O crítico de arte e amigo íntimo de Silvio Pleticos, Péricles Prade, avaliou o quanto a Cultura é apreciada como tributária no Brasil. “Em geral, em nosso país, a Cultura é vista quase sempre como caudatária, partidária dos demais setores da administração pública. Há um certo viés nesse sentido, representando um desprezo à Cultura propriamente dita, sob o ângulo antropológico, sociológico ou de outro vetor. Contudo há exceções. Hoje, a Assembleia Legislativa, colabora para propiciar à Cultura de Santa Catarina uma homenagem a um artista plástico, reconhecidamente um mestre da pintura, cuja expressão, asseguro, é universal.”
Péricles Prade ressaltou que Silvio Pleticos poderia, hoje, na idade a que chegou, residir na Europa, nos Estados Unidos ou em qualquer lugar nesse globo, que sua obra teria uma projeção internacional. “Ele preferiu deixar sua cidade natal, Pula, na Itália, e viver no Brasil, inicialmente em Ribeirão Preto, São Paulo, e depois em São José, Santa Catarina. Aqui ele construiu uma obra formidável. Dizem que sob influência de Pablo Picasso, Georges Braque, Paul Cézanne ou até de Henri Matisse. Mas, a verdade é apenas uma, e reafirmo na condição de crítico de artes plásticas: não se trata de simples influência, nem de incorporação ou de apropriação de estilos, não obstante ele tenha perpassado por diversos deles, dominado-os com absoluta perfeição técnica. Quando nós nos referimos ou se refere a essas possíveis influências é porque a sua obra revela um ofício estilístico que lembra pintores da mais alta categoria, pintores que fizeram e fazem a história da arte, como ele também fez e continua fazendo a história da arte em santa Catarina, no Brasil e mesmo fora do nosso país.”
Sobre Silvio Pleticos
Quando a Alemanha nazista invadiu a Polônia em 1939, Pléticos tinha 15 anos. Nessa época, a Itália já sofria com os efeitos do fascismo, liderado por Mussolini. Pula estava localizada em uma região marcada por diversos conflitos separatistas e étnicos. Logo, o garoto foi recrutado ao campo de batalha para defender o exército da Iugoslávia na Segunda Guerra Mundial. Na batalha, o novo encontro com a fome. Desta vez, não pode correr para o mar, como costumava fazer, para pescar. Distraía-se nos traços feitos em papel e encontrava alimento para a alma.
As primeiras ilustrações, feitas a partir de fotos, garantiram-lhe a sobrevivência. “Não fosse a habilidade de desenhar frente a modelos, a capacidade de retratar com fidelidade as feições do líder iugoslavo Tito Broz, é bem possível que hoje não estivesse mais entre nós”, narrou o advogado, escritor e crítico de arte, Péricles Prades, no livro “A Pintura de Silvio Pléticos” (2010).
Ao fim da guerra, em 1945, Pléticos fez sua primeira exposição a pedido do comandante. Ele tinha sido ilustrador oficial daquele exército, desenvolvendo murais informativos. Nesta época, além dos trabalhos que desenvolvia como “faz tudo”, começou a vender seus quadros e iniciou seus estudos na Escola de Artes de Zagreb, capital da Croácia, onde se especializou em pintura mural. O ponto de partida para sua atividade de professor também iniciou aí. Silvio Pléticos começou a lecionar e não mais parou.
Estabilizado profissionalmente, o artista e professor conheceu Lili, a quem deu seu sobrenome em pouco tempo. “Conheci Lili e, no momento em que a vi, soube que queria casar com ela.” Lili e Silvio casaram e viveram por dois anos na Europa em um campo de refugiados. Tinham a intenção de mudar para a Austrália, mas um irmão de Silvio que morava no Brasil os convenceu a vir para cá. “O Brasil é um país de oportunidades. Era um país rico comparado à Europa do pós-guerra. Até hoje, temos natureza e terras férteis em abundância”.
No Brasil, o artista pode viver sua arte e dedicar-se a ela integralmente. Na chegada ao Brasil, em 1961, morou em Ribeirão Preto, São Paulo, e realizou sua primeira exposição individual em terras brasileiras. Lecionou no Liceu de Artes, mas o casal não adaptou-se ao clima da região. Foram, então, para o Rio Grande do Sul, onde Silvio lecionou na Escola de Artes de Passo Fundo. No ano seguinte, em umas férias em Florianópolis, decidiu que aqui ficaria e nunca mais deixou a cidade. “Quando cheguei a Florianópolis e vi o mar, foi como se tivesse chegando em casa novamente. Nunca mais quis sair daqui”.
Em 1967, o casal mudou-se para Florianópolis, onde Silvio passou a ministrar aula de desenho e pintura no Museu de Arte de Santa Catarina. Atualmente residem em São José, na grande Florianópolis, onde o artista continua com sua atividade de ensino e exposições. Silvio e Lili passaram a criar perto do mar, fixaram residência e são referências artísticas no Estado. Juntos há quase 60 anos, Silvio afirma que não existe melhor mulher no mundo do que sua Lili.
A democracia da arte contemporânea
Artista contemporâneo, Pléticos trabalha assimilando e ao mesmo tempo desconstruindo estilos e movimentos estéticos. Ao longo dos anos, muitos críticos de arte nacionais e estrangeiros opinaram sobre seu trabalho. Entre eles, o poeta catarinense Lindolf Bell (1938-1998), que inaugurou a primeira galeria de arte de Santa Catarina. “Sua pintura é uma estrutura de resultados poéticos, quase metafísica, algumas vezes reconduz o espectador à reflexão, a indagações sobre o destino do homem e seus caminhos (descaminhos) de beleza, imaginação e força criativa”, descreveu no catálogo de uma exposição de 1980. Por conta dos interesses artísticos comuns, Pléticos foi convidado por Bell para ilustrar a terceira edição de “As Annamárias”, de 1993.
A arte contemporânea é democrática, segundo Pléticos, tanto para quem a faz, quanto para quem a aprecia. “A arte se espiritualizou, se desprendeu da matéria, da objetividade para ater-se à expressão do indivíduo que a constrói. O valor dela é dado pelo próprio homem. A imagem é física, mas as qualidades são etéreas, espirituais”.
Sobre a divulgação e incentivo ao exercício e apreciação da arte, Pléticos é incisivo. “Uma formação do gosto pela arte é necessária, as grandes nações já investem nisso há algum tempo”.
Sem denominação, as obras de Pléticos são classificadas apenas pela técnica sobre as quais são trabalhadas: acrílica ou mista. À mista, que consiste sobrepor a uma camada de cera, sobre uma grossa camada de tinta e desenhar com agulha as formas que se deseja, ele dedica suas atenções mais recentes.
Honrarias
1984 - Cidadão Honorário da Cidade de Florianópolis (SC)
1994 - Medalha do Mérito Anita Garibaldi pelos relevantes serviços prestados ao Estado de Santa Catarina
2000 - Cidadão Honorário da Cidade de São José, Santa Catarina, pelos relevantes serviços prestados ao Município
2001 - Medalha ao Mérito Cruz e Souza pelos relevantes serviços prestados a cultura do Estado de Santa Catarina (SC)
2004 - Fundado em São Pedro de Alcântara em 19 de julho de 2004, o Instituto Sílvio Pléticos
2005 - Cidadão Honorário Alcantarense pelo apoio cultural prestado ao Município de São Pedro de Alcântara Santa Catarina (SC)
2012 - Medalha ao Mérito por serviços prestados a cultura catarinense "ACAP"
Membro da Academia de Letras e Artes de Florianópolis - Santa Catarina – Brasil - Ocupa a cadeira de número 15 cujo patrono é Ernesto Meyer Filho
Prêmios
1972 - Prêmio Salão Sesquicentenário da Independência Florianópolis Santa Catarina (SC)
1º Prêmio Salão SAPISC Florianópolis (SC)
1975 - 1º Prêmio "Istria Nobilíssima" Trieste, Itália
Agência AL