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24/08/2022 - 08h30min

Personalidades do Parlamento: Paulo Stuart Wright

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Paulo Stuart Wright durante atividades na Assembleia Legislativa de SC. FOTO: Arquivo Pessoal

O deputado joaçabense Paulo Stuart Wright - o mais conhecido dos desaparecidos catarinenses durante o regime militar - é quem dá o nome ao plenarinho da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), um dos principais palcos de debates e reuniões do Parlamento.

Eleito deputado estadual em 1962, foi cassado em maio de 1964, sob o argumento de que comparecia às sessões sem paletó e gravata. Em 1993, teve o mandato restituído, em ato post-mortem. Dois anos depois, no dia 26 de junho de 1995, a Alesc presta mais uma homenagem a Paulo Stuart Wright, ao usar o seu nome para denominar o plenarinho da Casa.

Filho de missionários presbiterianos norte-americanos, Maggie Belle Wright e Lothan Ephrain Wright, nasceu em 1933, em Joaçaba. As condições de trabalho dos operários sempre foi uma preocupação para o jovem Paulo Stuart Wright. “Ele significou uma mudança inusitada para a política padrão que se fazia em Santa Catarina, entre os anos 50 e 60. O estado era dominado por dois partidos políticos oligárquicos e elitistas, o PSD e a UDN. Wright significou uma alternativa no interior desta estrutura partidária sólida, com uma vinculação com os movimentos populares”, destaca o professor do Departamento de História da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), Reinaldo Lohn.

ESPECIAL: Clique aqui e confira a íntegra das reportagens sobre Paulo Stuart Wright

O professor diz que Paulo Stuart Wright sempre fez questão de atuar junto aos trabalhadores manuais, na construção civil ou como torneiro mecânico. “Ele tinha essa vinculação a partir de sua religiosidade, de sua família de missionários presbiterianos, com trabalho de assistência social. Então ele, neste quadro de política no estado significou um contraste bastante acentuado. Uma pessoa que contesta posições políticas consolidadas e que atua de baixo para cima”.

Personalidade marcante
Casado com Edimar Rickli, o casal se engajou num projeto da Igreja Presbiteriana nas fábricas paulistas. Wright aprendeu o ofício de torneiro-mecânico e atuou no bairro operário de Vila Anastácio. O primeiro filho do casal acabou falecendo por falta de assistência adequada do hospital em que estava internado. “Ele jurou que lutaria para que isso não se repetisse na vida de outros operários. Foi sua convicção que não fez com ele procurasse um tratamento em outros hospitais para a criança”, diz Lohn.

Para o professor, é difícil definir a personalidade do jovem Paulo Stuart Wright, mas é possível entender a complexidade social do pós-Segunda Guerra Mundial, numa época de protagonismo da juventude. “Nos anos 60, a juventude surge como um movimento político. O fato de ser jovem representava apresentar ideias novas, apresentar uma postura contestadora à estrutura vigente. Fora isso, ele tinha um sentimento de humanismo cristão muito acentuado que fazia parte de sua denominação religiosa”, conclui Lohn.

Em SC, fortalece atuação em favor dos pescadores
De volta ao seu estado natal, Santa Catarina, Paulo Stuart Wright ajudou a criar os primeiros sindicatos de trabalhadores em Joaçaba. Assumiu uma secretaria municipal e foi o primeiro candidato protestante à prefeitura da cidade, em 1960. Concorreu pelo PTB e perdeu por 11 votos. Em seguida, o PTB passa a compor a chapa vitoriosa ao governo do Estado, que tem como governador Celso Ramos. “O vice-governador na época, Doutel de Andrade, era do PTB, e Paulo Stuart, como militante da legenda, é convidado a vir para Florianópolis para atuar na imprensa oficial.”

Com um forte trabalho social e atuando na política partidária, em 1962, Paulo Stuart Wright é eleito deputado estadual, com 2.144 votos, pelo PSP (Partido Social Progressista). Nesta época, começa a se aproximar da Ação Popular Marxista Leninista (AP), organização política que tem por base movimento estudantil cristão, juventude universitária católica.

“Ele se aproxima da AP, e começa a ser visto como comunista, uma pessoa que gera constrangimentos no interior da Alesc. O Paulo não é bem visto pela imprensa, pelos partidos dominantes, e essa situação só vai se agravar no início de 1964, quando há o golpe de estado”, conta Lohn.

Cassação
Depois de abril de 1964, a Assembleia Legislativa, para demonstrar sua adesão ao novo regime e sob pressão da Marinha e da Secretaria de Segurança Pública, sentiu-se na obrigação de cassar o mandato político de algum deputado considerado subversivo. Como Paulo Stuart Wright não usava gravata e paletó quando subia à tribuna, acabou sendo cassado por “falta de decoro parlamentar”, em 9 de maio de 1964.

Há registros de que o próprio PTB, partido do presidente da República deposto, votou a favor da cassação. Apenas Genir Destri e Antônio Pichetti votaram em defesa do deputado joaçabense.

Desaparecimento
Depois de ser cassado de seu mandato na Assembleia Legislativa, em 1964, Paulo Stuart Wright se asilou no México, de onde voltou um ano depois. Nos primeiros dias de setembro de 1973, foi sequestrado pelo Exército e levado ao DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna) de São Paulo, onde há suspeita que foi morto sob tortura nas primeiras 48 horas de cárcere.

Apesar de todos os esforços empreendidos pelos familiares, sua prisão nunca foi confirmada e seu corpo até hoje não foi localizado. Sua ficha foi encontrada na gaveta dos arquivos secretos do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) do Paraná, que continha 17 militantes de oposição ao regime militar com a anotação de “falecidos”.

Luta pelos Direitos Humanos
Com o desaparecimento de Paulo Stuart Wright, surge um grande símbolo da luta pelos Direitos Humanos no Brasil, o seu irmão, o pastor presbiteriano, Jaime Wright, que em outubro de 1975, foi um dos celebrantes do culto ecumênico realizado na Catedral da Sé, em São Paulo, em protesto contra a morte de Vladimir Herzog, vítima da ditadura. Também foi um dos responsáveis pelo projeto “Brasil: Nunca Mais”, que propiciou profundo inventário das torturas e dos assassinatos perpetrados pelos porões do regime militar.

“O irmão mais velho, o reverendo Jaime, é o grande companheiro da vida dele, que tem papel significativo na preservação da memória, porque em função do desaparecimento de Paulo Stuart vai procurar a Comissão de Justiça da Igreja Católica, em São Paulo, se torna aliado de Dom Paulo Evaristo Arns, e vai viabilizar aquilo que se chamou posteriormente o projeto “Brasil: Nunca Mais”, que reúne documentos, provas, informações que comprovassem que a ditadura montou um aparato repressivo gigantesco que tomou todo estado brasileiro”, relembra Lohn.

Comissão de Verdade
Com o trabalho da Comissão da Verdade, a partir de 2014, esse caso foi investigado e novas informações vieram à tona. “Paulo Stuart Wright segue sendo um símbolo do aparato repressivo em Santa Catarina. Não é o único caso, há outras vitimas catarinenses que foram mortas, mas ele é o símbolo maior. Um dos grandes legados dele é a denúncia de que o Estado brasileiro foi palco de montagem de uma estrutura gigantesca, complexa de repreensão, que não foi uma coisa excepcional. Comprometeu todo o conjunto do Estado, das forças armadas”, conclui Lohn.

A ferida aberta do desaparecimento
Emocionado, o analista de sistema, João Paulo Wright, 59 anos, filho do político desaparecido, Paulo Stuart Wright, não esconde a ferida daqueles que perderam seus entes queridos durante a ditadura militar, e lamenta que tenha convivido muito pouco com seu pai. “O sofrimento nunca termina, está no dia a dia. E o fato de não haver os restos mortais para enterrar é um trauma a mais, como sempre acontece nessas situações”, conta ao visitar o plenarinho da Assembleia Legislativa. “Sempre que venho a Florianópolis visito o plenarinho, uma homenagem prestada pelo Parlamento ao meu pai depois que restituíram o seu mandato.”

João Paulo nasceu em Florianópolis, mas reside em Curitiba, para onde a família se mudou após o desaparecimento de Paulo Stuart Wright, em 1973. Nascido um ano antes do golpe de 1964, João Paulo avalia que o episódio desestruturou a família. “Uma vez um repórter me perguntou como eu reagiria se meu pai aparecesse na porta de casa”, conta. “Por um momento, tive a sensação de que aquilo era possível”.

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