Escritoras negras querem livros para crianças negras nas livrarias e escolas
Escritoras negras que publicam livros de histórias sobre negros para crianças negras pediram, durante discussão alusiva ao Dia da Mulher promovida pela Bancada Feminina, que os livros que retratam vivências das comunidades negras tenham espaços nas livrarias e nas bibliotecas escolares. O debate se deu no plenarinho da Assembleia Legislativa, na noite de quinta-feira (9).
“A literatura negra não chega, as autoras negras não chegam nas escolas, a Editora Cruz e Sousa vai nos eventos mostrar que existe uma literatura negra – para nós literatura negra é a escrita por autores negros – mas não chegam nas escolas, nas livrarias, e isso significa que a população não tem acesso”, avaliou a doutora Maria Aparecida Rita Moreira, professora da rede estadual aposentada.
Maria Rita foi adiante e pediu o apoio dos leitores. “Precisamos de mais espaços para a literatura negra, precisamos que aqueles que têm contato com a literatura passem a ser seus multiplicadores, para que as crianças negras possam se ver nos livros, para que possam ver a possibilidade de serem escritores, de serem ilustradores”, exemplificou.
Para Priscila de Freitas, professora da rede pública de Florianópolis, a transposição das vivências de pessoas negras para os livros, além de trazer para o presente um passado quase esquecido, potencializa e amplia as oportunidades das crianças leitoras.
“É potente para a comunidade que a gente fale das nossas experiências, tem muita história que o morro conta e que a Grande Florianópolis precisa conhecer”, apontou Priscila.
Pesquisadoras e escritoras
No caso das escritoras de literatura infantil da Editora Cruz e Sousa, que contam histórias de homens e mulheres negros, o conteúdo dos livros deriva das pesquisas acadêmicas realizadas e das experiências vividas.
“Me aposentei em 2017 e comecei a levar para o neto as história da literatura negra, que a gente tem de pesquisar, cavocar, ‘em qual livraria vou achar’, porque não está disponível como as demais (obras literárias). Fruto dessa vivência em casa veio o ‘Nós, vovó e os livros’ , que é um projeto de afetividade, que dialoga com a pesquisadora, nele procuro trazer Antonieta, Tereza de Benguela, africanidades catarinenses e outros livros de uma maneira geral”, revelou Maria Rita.
“Fiz a pesquisa acadêmica, mas e minha comunidade, como fica a leitura? Pensei em escrever sobre alguma personalidade da comunidade que já tinha partido e que não se falava mais nas conversas, na escola da comunidade, na creche”, explicou Priscila, aludindo ao livro “O orocongo do menino Gentil”, que retrata histórias de Gentil Camilo Nascimento Filho, que morou no Monte Serrat, em Florianópolis.
“Havia essa ausência da memória desse morador”, afirmou Priscila.
Já a professora Eliane Debus, da UFSC, falou sobre a gênese do livro “Triolé, triolé poemas de Cruz e Sousa vamos ler”, também publicado pela editora Cruz e Sousa.
Segundo a doutora Eliane, um menino leitor escreveu-lhe sugerindo que depois de escrever sobre uma menina negra (Antonieta de Barros), dfaltava escrever sobre um menino negro.
A pesquisadora decidiu por Cruz e Sousa, comprou biografias do poeta e começou a leitura das suas obras, popularmente consideradas de difícil compreensão.
“Senti que não ia conseguir escrever sobre Cruz e Sousa”, confessou Eliane, isso até se deparar com os triolés (estrofes com oito versos e duas rimas, com o primeiro, o quarto e o sétimo versos iguais) escritos para o “Jornal Moleque”.
“Se uma criança lê, não precisa contextualizar, tem a rima, mas no ensino médio posso fazer a contextualização histórica”, observou a professora.
Eliane Debus contou que durante a pandemia promoveu a formação online de alguns professores da rede pública do Sul do estado para trabalhar os triolés de Cruz e Sousa nas aulas.
“Os professores se envolveram tanto, eles trabalharam com o livro em escolas de Passo de Torres, São João do Sul, Praia Grande, Santa Rosa do Sul, Sombrio e Balneário Gaivota”, informou Eliane.
Agência AL