Autismo: causas são desconhecidas, mas há evidências neurobiológicas
De acordo com o doutor em neurologia, Clay Brites, convidado do 4º Congresso Catarinense sobre Autismo, promovido na última quinta-feira (4) pela Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira e Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência, as causas do autismo são desconhecidas, mas há fatores neurobiológicos associados.
“É um mistério, a ciência ainda está se debruçando sobre isso, o que se sabe é que existem fatores neurobiológicos muito claros associados: síndromes genéticas, Down, X Frágil, uma lista, boa parte delas tem manifestação autista, 10% de Down tem autismo. E quantas pessoas se tornam autistas depois de crises epiléticas repetitivas? Epilepsia é outro eixo de pesquisa”, informou doutor Clay.
Segundo o especialista, também estão associados ao autismo as comorbidades psiquiátricas e transtornos do neurodesenvolvimento.
“Cerca de 85% dos autistas têm comorbidades psiquiátricas, então tem de tratar todas. Às vezes não é o autismo que está atrapalhando na escola, é o Transtorno de Personalidade Histriônica (TPH), se a escola não mudar o jeito de dar aula, não vai resolver. Esquizofrenia? Se não tratar, não vai resolver. Tive um paciente de 11 anos que via monstros na escola. Mediquei, trabalhei muito no concreto, fui lá, mostrei, coloquei a mão para ele ver que não tinha monstros”, exemplificou.
No caso de transtornos do desenvolvimento cerebral, doutor Clay citou a teoria da Poda Neuronal, que propõe que parte dos neurônios com morte programada, na prática sobrevivem.
“O desenvolvimento neuronal se dá por etapas, a cada seis meses, um ano, dois anos, o cérebro passa por uma morte neuronal programada, faz parte da programação, são momentos do cérebro, os neurônios têm de morrer. Como não morrem, ficam lá fazendo peso e os cérebros eram até superiores que os de crianças que já nasceram autistas”, revelou o pesquisador, aludindo às pessoas que se tornaram autistas depois do nascimento.
Também destacou as alterações estruturais no cérebro.
“Certas áreas que eram para funcionar, não funcionam, são alterações na arquitetura dos neurônios e quando uma área não funciona direito, outras tentam assumir o papel e compensar, mas como tudo na vida, não fazem isso muito bem.”
Clay Brites contou que se a alteração cerebral estiver localizada próxima do Quadrilátero de Pierre Marie, as ligações cognitivas linguísticas mais profundas e as emoções estarão comprometidas.
Outros fatores
O especialista, com menor ênfase, citou outros fatores associados ao autismo, como obesidade na gestação, lúpus, pré-eclâmpsia, alergias alimentares ou respiratórias e intolerâncias alimentares.
‘‘As mães que ganharam muito peso, 25, 30 quilos, alguns artigos têm mostrado que neste grupo tem nascido mais autistas”, justificou, que ponderou ser muito cedo para associações conclusivas com os demais fatores.
O tratamento
Concluído o diagnóstico, começa o tratamento terapêutico indicado ao perfil do autista, com intervenções comportamentais e no desenvolvimento.
“O autismo é uma condição médica, precisa de tratamentos específicos e investigações que estão fora do espectro autista, mas que estão associados a ele. Mas não é só tratamento, precisa passar por avaliações dinâmicas, por exemplo, temos de entender porque a partir de um certo ponto há uma queda da capacidade de compreensão de texto, 50% dos autistas têm comprometimento intelectual.”
O neurologista assegurou que as intervenções visam os comportamentos inadequados ou adaptativos, podendo ser intensivo – “20 horas por semana, 12 semanas, para superar logo os atrasos” – e comunitários, como as Apaes, centros de terapia e clínicas.
“Vai ao banheiro sozinho? Segue regras sozinho? O que está impedindo de dar conta? Tem de fazer ele ter prazer em fazer daquele jeito, primeiro ensina, deixa ele ser metódico, depois ensina que não precisa ser metódico sempre. Faz o treino, ensina o passo-a passo, se vai adquirir autonomia, isso vai depender do nível intelectual da criança.”
De acordo com o pesquisador, a vantagem da intervenção intensiva está na forma interdisciplinar da abordagem, com neurologista, psicólogo, fonoaudiólogo e outros profissionais “trocando figurinhas”, enquanto na intervenção comunitária os profissionais atuam com pouco ou sem diálogo, “cada um na sua.”
No caso de bebês, Brites defendeu o recurso à intervenção intensiva.
“Nos primeiros três a cinco anos é isso aqui que temos de buscar: uma criança que quero que corrija logo o atraso, ou que quero buscar o empate, intervenção intensiva. Vai ter cura? Vai sair do espectro? Não, ele está aqui, então quero que caminhe para a fronteira, não sei se vai chegar, mas se estiver caminhando, ótimo.”
A família, avaliou o médico, joga um papel decisivo nas intervenções.
“A família está no centro, as melhores intervenções são naturalísticas, dentro do consultório e com a versão para fazer em casa, na casa da avó, no shopping, na escola, porque a gente precisa generalizar as intervenções, autista não generaliza, então temos de acostumá-lo a generalizar”, ensinou, ressaltando que o método mais utilizado é a Análise de Comportamento Aplicada (ABA - Applied Behavior Analysis).
Uso de medicamentos
Doutor Clay propôs o uso de medicamentos para reduzir sintomas, como agressão ou déficit de atenção.
“Uma vez receitei um medicamento que reduz a capacidade auditiva, porque para ir no supermercado com a mãe o paciente tinha de passar pelos carros barulhentos, passava um, ele voltava para casa. Não é para dopar, modificar a personalidade, é para melhorar a qualidade de vida do autista e dos cuidadores, tem coisas que sem medicação não andam”, reconheceu.
Tratamentos alternativos e complementares
Brites abordou ainda os chamados tratamentos alternativos e complementares, como as dietas restritivas, equoterapia, sinoterapia e eletroestimulação.
“Aqui não há receita de bolo, mas temos de ter bom senso. Em linhas gerais cada caso é um caso, mas é preciso respeitar as condições financeiras das famílias”, alertou.
Agência AL