Audiência pública debate regionalização dos serviços públicos de saneamento
A microrregionalização dos serviços públicos de saneamento básico foi discutida em audiência pública, realizada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa, nesta terça-feira (30). O objetivo foi discutir o projeto de lei complementar (PLC) do Poder Executivo que trata do tema. O evento foi solicitado pelo presidente da comissão e relator do PLC, deputado Camilo Martins (Podemos).
Protocolizado na Assembleia no fim do ano passado, o PLC 40/2023 institui a Microrregião de Águas e Esgoto de Santa Catarina (Mirae-SC), bem como sua estrutura de governança. Conforme justificativa do projeto, a ideia é cumprir o Marco do Saneamento Básico, uma lei federal de 2020 que estabeleceu, entre outras metas, a universalização do acesso à água tratada e da coleta e do tratamento de esgoto até 2033.
A proposta apresentada pelo governo estadual trata da regionalização dos serviços de saneamento, condição necessária para o recebimento de recursos e de financiamentos com recursos da União para a prestação desses serviços. Para isso, o Executivo propõe a criação de uma única microrregião em todo o estado, composta por três câmaras temáticas, formadas por municípios atendidos pela Casan, por empresas privadas e por empresas públicas municipais. O modelo já foi adotado por 16 estados brasileiros.
O deputado Camilo Martins relembra que, quando o PLC foi apresentado na Casa, chamou muito a atenção de prefeitos, presidentes de câmaras de vereadores, associações e federação dos municípios. “Por meio desta audiência pública, buscamos adequar o projeto ouvindo as associações, entidades e sociedade civil. Este é um projeto que, para mim, é complexo porque muitos municípios vão se opor, um município vai precisar do aceite do outro para que as mudanças aconteçam e cada um tem uma particularidade. Acho muito engessado, e acredito que colabora, sim, com a Casan. Vai fortalecer a estatal, mas precisamos ver se esse é o desejo dos prefeitos, das associações de municípios”.
Segundo o parlamentar, o projeto impacta na autonomia dos municípios, “por isso a importância de debater com toda a sociedade, com o governo, com a Casan e com os deputados que estão muito apreensivos. Temos que ter muita sensibilidade para chegar ao melhor entendimento e, a partir do que foi colocado hoje, por todos os participantes, vamos levar novamente à CCJ e adequar o projeto para que todos sejam atendidos da melhor forma”.
Lei federal
Wladimir Ribeiro, consultor jurídico do estado para regionalização do saneamento, apresentou a proposta encaminhada pelo governo do Estado. Segundo ele, a regionalização é um dever do Estado e se baseia na Lei Federal no. 14.026/2020 que prega que a ausência da regionalização do saneamento em um estado prejudica o acesso de recursos federais de seus municípios, prestadores de serviços e a própria administração estadual – seja orçamentários, seja de operação de crédito.
Nesse modelo, os municípios devem se organizar para produzir soluções conjuntas. Conforme Wladimir, "sem o esforço dos municípios juntamente com o Estado, sem a harmonização da atuação dos municípios, entre si e com o estado, o Brasil não vai conseguir universalizar o acesso aos serviços públicos de saneamento básico”.
Segundo o assessor jurídico, essa lei criou uma pressão e quem não regionalizar não vai ter acesso aos recursos federais. “O governo foi muito rigoroso na criação dessa lei, porque não apenas recursos orçamentários estão em jogo, mas também recursos oriundos das operações de crédito”.
Dos 26 estados brasileiros, apenas três não se regionalizaram: Tocantins, Mato Grosso e Santa Catarina. O Ceará e o Paraná são os exemplos de regionalizações melhor sucedidas, conforme Wladimir. Desses, 16 estados adotaram o modelo da microrregião, proposto pelo governador de Santa Catarina.
“Desses exemplos, quem regionalizou pela microrregião teve melhores avanços, até pela orientação dada pelo Supremo Tribunal Federal, pela segurança jurídica que essa modalidade de regionalização proporciona e ajuda na viabilização de investimentos. O Paraná, até agora, é o melhor saneamento do país e vai universalizar em 2027, três anos antes do proposto pela lei federal. No conjunto todos ganham. Não adianta ter um saneamento correto num município e um errado em outro, o que leva a poluição do que estiver adequado pelo que não estiver”, defendeu.
O assessor jurídico afirma, ainda, que Santa Catarina tem indicadores sociais, de educação, e de assistência à saúde elevados, mas somente 33% da população é atendida por coleta e tratamento de esgoto. “Para mudar essa realidade, precisamos atrair investimentos e, para isso, precisamos dar segurança para isto. Então, esse projeto de lei complementar que está aqui, encaminhado pelo governador, objetiva dar segurança para os investimentos e para que toda a população catarinense, até 2033, tenha acesso a abastecimento de água e esgotamento sanitário”.
Preocupação dos municípios
Vinícius Neres, diretor jurídico da União dos Vereadores de Santa Catarina (Uvesc), colocou a preocupação dos municípios em relação à titularidade dos serviços básicos. “Esse projeto conta com a possibilidade de criação de uma estrutura que concentra um poder de decisão no Estado e, a nosso ver, retira certos poderes da autonomia dos municípios. Temos acompanhado o desenvolvimento dessa pauta, porque a realidade de cada município é muito específica. Não podemos tratar um município como Florianópolis e Joinville, por exemplo, da mesma forma que municípios pequenos do estado, que tem compartilhamentos diferentes de estrutura. Nossa preocupação é grande, especialmente em relação a esse ponto”.
Segundo Vinícius, a microrregião é estruturada para ser um grande conselho. “Entendemos que a melhor organização para decidir o melhor para si é o próprio município. Esperamos que exista um respeito aos poderes, às atribuições do município para a escolha do modelo a ser adotado. Ser atrelado à Casan não é um problema, mas esperamos um diálogo com os municípios e com a Assembleia para que a individualidade seja respeitada".
O PLC 40/2023 tramitava em regime de urgência, porém o Executivo solicitou a retirada da urgência em março. A proposta está sob a análise da CCJ, mas também será apreciada pela Comissão de Finanças e Tributação e pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público.
Na audiência pública, também participaram do debate, os deputados, Maurício Eskudlark (PL), Mário Motta (PSD), Marquito (Psol) e o deputado licenciado Matheus Cadorin (Novo).
Agência AL