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20/03/2014 - 13h10min

Análises iniciais preveem assentamento de 20 hectares e 60 famílias na SC-401

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Audiência pública discutiu a situação da ocupação Amarildo de Souza. FOTOS: Eduardo Guedes de Oliveira/Agência AL

De acordo com análise inicial do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), apenas cerca de 20 dos 900 hectares ocupados por sem-tetos às margens da SC-401, no Norte da Ilha de Santa Catarina, podem abrigar moradias, uma vez que o restante configura áreas de preservação permanente (APP). Já o Incra estimou assentar no espaço somente 60 famílias. O anúncio dos estudos preliminares ocorreu na noite desta quarta-feira (19), durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Assembleia, que debateu a “ocupação Amarildo de Souza”, assim chamada em homenagem ao pedreiro morto sob tortura na sede da Unidade da Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha, no Rio de Janeiro.

Segundo Silvio de Souza Junior, chefe da Estação Ecológica de Carijós, localizada defronte à ocupação Amarildo, na margem oposta da SC-401, mais da metade do manguezal do rio Ratones está fora da reserva, estendendo-se até o espaço situado atrás da ocupação. “Olhando o conjunto das terras a maioria é constituída de manguezais e ambientes de transição, tudo APP”, ponderou o representante do ICMBio.

A informação não agradou os líderes da ocupação, uma vez que há mais de 700 famílias acampadas no local.  João Vitor Araújo protestou e exigiu isonomia por parte dos poderes estatais. “Várias construções foram autorizadas para a burguesia sobre mangues, sobre APPs, como o Shopping Iguatemi”, criticou. Mauro José Velho, do MST, lembrou que o Floripa Shopping e as Lojas Cassol foram erguidos sobre o mangue. “Para a burguesia pode tudo”, lamentou o membro do Movimento dos Sem Terra. Para Robson Ceron, do PCB, o argumento de que a maior parte das terras configura APP é fraco. “Se fosse para um resort ou um campo de golfe não seriam apenas 20 hectares, nem estaríamos discutindo a questão ambiental”, observou. 



A discussão sobre o tamanho da área que supostamente abrigará as moradias e a produção de alimentos agroecológicos só foi possível porque a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) concluiu, após análise no local, que o polígono de terras de 900 hectares reivindicado pelos sem-tetos pertence ao governo federal. “Um dos méritos da ocupação foi a vistoria que a SPU fez no local, a área foi considerada por nós propriedade da União”, descreveu Silvia Beatriz de Luca, superintendente da SPU, completando em seguida que após parecer conclusivo do ICMBio e ouvida a prefeitura de Florianópolis, acontecerá a discussão sobre a destinação da área. “Não é a secretaria que vai decidir sozinha, vai discutir com a sociedade, com as demais instituições”, informou, acrescentando “que a destinação vai respeitar a legalidade e as questões ambientais”.

Além disso, a procuradora da União, Dalvani Luzia Propodoski Rocha Vieira Jank, afirmou aos participantes da audiência que os documentos indicam uma sobreposição de titulação naquela área de terras. “Caso exista algum título de propriedade sobre a área vamos ingressar com processo judicial para reverter a titulação”, declarou, informando que estes procedimentos jurídicos “demandam algum tempo”. Robson Ceron contextualizou a explicação da procuradora. “Abre um processo, intima o cara, tem prazos, recursos, daqui uns 500 anos o processo estará resolvido”, prognosticou.

Uma nova situação jurídica
De acordo com Rui Fernando da Silva, que representou os ocupantes na audiência pública, o acordo celebrado com a Justiça Agrária, que  previu a desocupação das terras em 15 de abril, será cumprido. “Nós vamos cumprir o acordo, vamos respeitar porque queremos o respeito deles”, afirmou Rui, aludindo aos membros do Poder Judiciário. Entretanto, conforme explicou o líder da ocupação, há uma nova situação jurídica, não compreendida no acordo judicial. “A terra é pública, estamos aqui abertos a encontrar a saída, e a saída do conflito é o assentamento de todas as famílias”, argumentou.

As decisões dos cidadãos
Os cidadãos presentes à audiência acataram sugestão da deputada Luciane Carminatti (PT), presidente da CDH, de constituir um grupo de trabalho integrado pelas instituições cujas competências concorram para a solução do problema, como ICMBio, Incra, SPU, Ministério Público Federal, Advocacia-Geral da União, prefeitura de Florianópolis, para planificar e agilizar os procedimentos judiciais e administrativos necessários.

Também foi decidido que a CDH notificará extrajudicialmente a RBSTV e o jornal Diário Catarinense pela criminalização dos membros e líderes da ocupação, e que o Incra realizará nos próximos dias uma vistoria no local para detectar a viabilidade de produção agrária nas terras.

O conflito ideológico
As diferenças radicais acerca da organização do estado, capitalista ou comunista, marcaram as falas dos participantes da audiência. Vestidos de vermelho e com bandeiras do Partidão, como é nostalgicamente chamado o Partido Comunista Brasileiro (PCB), os militantes cantaram palavras de ordem contra a burguesia e o capitalismo. O deputado Sargento Amauri Soares (PSOL) criticou aqueles que veem na ocupação de terras ecos do passado. “Essa ocupação é um apontamento para o futuro, vale mais ter um assentamento da reforma agrária popular do que um campo de golfe”, comparou Soares, concluindo que a ocupação de terras urbanas “aponta para um futuro que a sociedade precisa construir”.

Henrique Flores, da União da Juventude Comunista, explicou com clareza a posição dos sem-tetos. “A gente não está pedindo nada, está exigindo nosso direito, não queremos saber se aquela área é isso ou aquilo, a gente está enfrentando vocês, esse Estado não representa a gente,”, declarou, referindo-se aos representantes dos órgãos públicos e ao suposto proprietário das terras ocupadas, o ex-deputado Artêmio Paludo, de Concórdia.

Angela Albino (PCdoB) hipotecou solidariedade à ocupação Amarildo de Souza e declarou que “muito raramente o auditório deputada Antonieta de Barros foi lotado de verdade de povo”, uma vez que a Assembleia “é a casa das gravatas e dos sapatos”. O juiz agrário Rafael Sandi, que participou da primeira parte da audiência, não gostou da metáfora e objetou que usa terno e gravata em virtude da função que exerce. “Meu sapato tem terra do acampamento”, contrapôs.

Vítor Santos
Agência AL

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