Quem procura os desaparecidos
Quando precisam de apoio das estruturas de segurança pública na busca de desaparecidos, os familiares se deparam com a falta de estrutura e de pessoal nas delegacias, agravada pela inexistência de integração dos sistemas de dados de segurança pública no país.
Oficialmente, há 5,5 mil pessoas desaparecidas em Santa Catarina. Há dois anos, quando a Delegacia de Polícia de Pessoas Desaparecidas (DPPD) iniciou as atividades, havia 18,5 mil desaparecidos registrados. Esse número caiu à medida que o sistema foi sendo atualizado, de acordo com o delegado titular do órgão, Wanderley Redondo. Nesse período foram registrados mais de 3,8 mil boletins de ocorrência de reaparecimento de pessoas.
As autoridades policiais apostam que o número de 5,5 mil desaparecidos diminuirá ainda mais com o aperfeiçoamento do sistema e a integração de dados. A partir da criação da Política Estadual de Busca de Pessoas Desaparecidas, familiares e agentes públicos serão obrigados por lei a comunicar o reaparecimento de uma pessoa que constava na lista de desaparecidos.
Hoje, a desatualização faz com que os policiais percam tempo fazendo comparações de prontuários e procurando familiares de pessoas que muitas vezes já voltaram para casa ou deram notícia. Outro agravante é que atualmente as pessoas mudam de operadora e de número de telefone celular com muita facilidade, fator que dificulta a localização de parentes.
Com o aprimoramento do sistema de informações, transferência de dados e comunicação em rede entre os diversos órgãos envolvidos, previsto na nova lei, também deve ser agilizado o bloqueio dos documentos da pessoa desaparecida. A partir do registro do desaparecimento, a Carteira de Identidade (CI) ou Registro Geral (RG), a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e o documento de veículo do desaparecido, se houver, serão bloqueados. “A pessoa precisará fazer um boletim de reaparecimento para desbloquear os documentos”, explica Redondo.
Estrutura para investigação
A Polícia Militar de Santa Catarina tem uma equipe especializada dedicada à busca, divulgação e armazenamento de dados de desaparecidos. Além de disponibilizar aos familiares canais para divulgar imagens e dados sobre a pessoa desaparecida, o programa SOS Desaparecidos, coordenado pelo major Marcus Roberto Claudino, auxilia na prevenção e no encaminhamento psicossocial das famílias, desde 2012. Em três anos de atividades, a equipe já conseguiu localizar diretamente 548 pessoas.
Desde 2013, Santa Catarina conta também com a DPPD, situada na Capital. A delegacia especializada foi a terceira no país a ser instalada, em função do crescente apelo social, e recebe informações de todas as ocorrências de desaparecimento e de reaparecimento ocorridas no estado. No início, dispunha de oito profissionais, incluindo o delegado titular, Wanderley Redondo. Hoje ele conta com apenas dois profissionais de apoio para receber as ocorrências e fazer as investigações.
Apesar das dificuldades, a DPPD atua em parceria com outras instituições - Polícia Militar, Ministério Público e o Instituto Geral de Perícias (IGP) - em ações inéditas no Brasil, como a coleta de amostra de sangue para extração de DNA de familiares de desaparecidos. “As amostras são comparadas com perfis existentes no banco de dados estadual, para cruzamento de informações”, explica Redondo. Santa Catarina utiliza o Sistema Índice de DNA combinado, ou Codis, uma base de dados nacional, estaduais e locais, criada e cedida pelo FBI, a polícia federal norte-americana.
Outra ação sistemática que vem sendo realizada no estado é a abordagem e identificação de moradores de rua, também em uma operação conjunta das autoridades de segurança pública. Durante a abordagem, os papiloscopistas do IGP coletam as impressões digitais dos moradores de rua para confrontação com prontuários existentes no sistema Afis (em português, sistema de identificação biométrica).
Em uma operação realizada em Florianópolis, no mês de setembro, duas pessoas que constavam na lista de desaparecidos foram identificadas na rua, no bairro de Canasvieiras. “Em geral são dependentes químicos que saíram de casa e perderam o contato com a família”, explica o delegado. Ele espera que a identificação dos moradores de rua ajude a diminuir o número de pessoas enterradas como indigentes em Santa Catarina – foram 35 em 2014.
Falta integração
Uma pessoa desaparecida em Santa Catarina pode ter recomeçado a vida em outro estado com uma nova carteira de identidade porque no Brasil cada estado possui um sistema de registro geral, o RG, o que dificulta a investigação policial. No três estados do Sul os sistemas já estão integrados e espera-se que o mesmo ocorra em todo o país com a adoção de um novo modelo de RG pelo Ministério da Justiça.
O cadastro único de desaparecidos também não funcionou no Brasil. Santa Catarina, assim como alguns estados, aderiu ao Infoseg, da Secretaria Nacional de Segurança Pública. É um bom sistema, na opinião do delegado, mas os dados são acessíveis apenas para os policiais.
A falta de adesão de alguns estados a esse sistema precariza o trabalho policial. No começo de setembro, a DPPD fez uma operação conjunta com a Polícia Rodoviária Federal para identificação de garotas por meio de fotos e impressões digitais. “No momento que eu identifico, muitas delas são de outros estados. Eu não sei se são desaparecidas ou não, e não tenho como identificar quando o estado de origem delas não utiliza o Infoseg. Nesse caso, eu preciso solicitar o prontuário de cada uma ao estado de origem para verificar”, explica Redondo.
Quem são os desaparecidos
Meninas na faixa etária entre 12 e 15 anos estão entre os grupos mais vulneráveis no mapa dos desaparecidos no Brasil, conforme o sociólogo e professor da Universidade Federal de Goiás, Dijaci David de Oliveira. "Há uma incidência significativa de desaparecimentos de mulheres nessa faixa etária, seja em regiões de fronteira ou de turismo. É extremamente preocupante, porque há um mercado da exploração sexual muito forte", disse ele durante palestra no Seminário Nacional de Combate ao Desaparecimento e Tráfico de Pessoas, realizado na Assembleia Legislativa no mês de outubro.
No estudo “Desaparecidos Civis: um problema de gênero e geracional”, Oliveira analisa que os desaparecimentos femininos estão crescendo no Brasil. Elas desaparecem mais que os homens no Rio Grande do Sul, no Pará e em Pernambuco, por exemplo. A faixa de maior incidência são as mulheres jovens. “Além da violência urbana, pesquisas recentes indicam que os desaparecimentos são constituídos a partir de duas matrizes: os conflitos geracionais e a desigualdade de gênero. Por meio da perspectiva geracional, percebem-se os conflitos de valores e de práticas envolvendo pais e filhos. Por meio da matriz de gênero, observa-se ainda a herança do patriarcalismo vitimizando as mulheres e os filhos.”
A fuga representa o maior percentual das causas de desaparecimento, conforme o sociólogo. Em 70% dos casos é motivada pela violência intrafamiliar.
Recomendações em casos de desaparecimento:
- Em casos de desaparecimento, a família deve tomar providências formais e práticas.
- Procure seguir a trilha da pessoa desaparecida. Verifique se ela não está com um vizinho ou amigo.
- Se sumiu à noite, procure se informar se houve algum acidente. O desaparecido pode ser uma vítima não identificada em um hospital, por exemplo.
- Procure a polícia imediatamente, com uma foto recente. Registre o boletim de ocorrência e cobre a ação policial. Lembre-se de que não é necessário aguardar 48 horas para registrar o desaparecimento.
- Mantenha a calma. As informações que precisam ser repassadas aos policiais são importantes para a localização.
Fonte: www.desaparecidosdobrasil.org
Onde buscar ajuda
Programa SOS Desaparecidos da Polícia Militar
(48) 3229-6715 e (48) 9156-8264 | desaparecidos@pm.sc.gov.br
www.pm.sc.gov.br/desaparecidos
Delegacia de Polícia de Pessoas Desaparecidas (DPPD)
Disque-denúncia: 181 | (48) 3665-5595 | desaparecidos@pc.sc.gov.br
ONG Portal da Esperança
www.portaldaesperanca.org.br
(48) 3364 3898
ONG Desaparecidos do Brasil
www.desaparecidosdobrasil.org
(48) 3248 5111