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27/06/2017 - 13h56min

Projeto institui o uso do nome social em respeito às pessoas LGBT

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Nicolas Moritz Ronchi

Com referência ao artigo 5º da Constituição, que estabelece a igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza às diferenças de sexo, orientação sexual e identidade de gênero, o Projeto de Lei (PL) 48/2017, que tramita na Assembleia Legislativa, trata do reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais, a partir do uso do nome social, que dá liberdade às pessoas trans de serem chamadas pelo nome que escolherem.

De autoria do deputado Cesar Valduga (PCdoB), o projeto estabelece aos transexuais e travestis o direito à identificação por meio do nome social na hora de preencher fichas cadastrais como formulários, prontuários, registros escolares e documentos congêneres destinados ao atendimento de serviços prestados por qualquer órgão da administração pública. Após a aprovação, a determinação da matéria será válida em todo território catarinense.

Nome social
É o nome pelo qual os transexuais e travestis são chamados cotidianamente, em contraste com o nome oficialmente registrado, que não reflete sua identidade de gênero.


Observando que toda pessoa tem direito ao tratamento correspondente ao seu gênero, e que transexuais e travestis possuem identidade de gênero distintas do seu sexo biológico, Valduga destaca que a proposta visa evitar constrangimentos de caráter psicológico, no que tange ao  relacionamento com a sociedade. De acordo com o parlamentar, o PL estabelece a condição social para que os transexuais e travestis possam ser acolhidos de maneira harmônica, sem preconceitos da sociedade, principalmente dos órgãos públicos.      

O que muda
À frente da presidência do Conselho Municipal de Direitos das Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros (LGBT), Guilhermina Salasário Ayres ressalta a importância da aprovação da matéria. Ao comparar o PL em tramitação com a lei municipal já existente, Guilhermina afirma que o projeto possui mais abrangência, já que determina o uso do nome social antes do nome civil. "Essa determinação, de fato, faz toda diferença. De maneira simples e objetiva o PL assegura o direito de transexuais e travestis serem reconhecidos pelo nome social."

Para Guilhermina, com a proposta apresentada, muitos adolescentes e jovens que se descobrirem travestis não precisarão mais passar por constrangimentos. A conselheira explica que o reconhecimento público do nome social acaba com a exposição e a humilhação. "Com a nova legislação, o adolescente travesti vai ser chamado pelo nome social, ao qual corresponde a sua escolha, e não pelo nome civil que corresponde ao sexo do seu nascimento." Segundo ela, muitos travestis e transexuais não procuram sistema público de saúde, segurança ou educacional por não terem o direito de serem chamados pelo nome social. "Esse problema será resolvido com o projeto."

Na ocasião, Guilhermina solicitou que se volte a debater o Projeto de Lei 315/13, de autoria do Poder Executivo, que institui o Conselho Estadual de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais de Santa Catarina (CELGBT-SC). Segundo ela, a criação do conselho faria com que o Estado não ficasse por último na adesão, uma vez que muitos estados brasileiros já criaram os seus conselhos. "Não se trata de um conselho de privilégios, mas de igualdade de direitos." 

Direitos humanos
A presidente da Comissão de Direitos Homoafetivos e Gênero da Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Catarina (OAB/SC), Margareth da Silva Hernandes, explica que com a aprovação da matéria os órgão públicos, especialmente a Secretaria de Estado de Segurança Pública, vão passar a adotar em seus registros o nome social. Segundo a advogada, o órgão poderá adotar em suas ocorrências policiais o registro de identidade de gênero. "Visto como um avanço, na hora de realizar os cadastros nos serviços públicos de forma geral, o uso do nome social que será adotado nas delegacias será realizado também no sistema carcerário, viabilizando a criação de uma ala que proteja os transexuais. Atualmente não existe ala separada para os travestis e transexuais." 

Considerando que já existe legislação voltada para o uso do nome social no Brasil, o decreto 8727/2016, da ex-presidente Dilma Roulsseff (PT), Margareth acredita que Santa Catarina só tem a ganhar com a legislação estadual. "Essa é uma iniciativa que merece total reconhecimento por amparar as pessoas LGBT."

A descoberta e a importância de ser respeitado 
Transexual desde a adolescência, o estudante de licenciatura em teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), Nicolas Moritz Ronchi, relatou sua dúvidas e inseguranças até os 14 anos, quando descobriu que era transexual. Atualmente com 22 anos, Nicolas sentia, desde a infância, um desconforto em relação ao lugar onde estava no âmbito social, especialmente com as suas vontades de fazer coisas de menino, como andar sem camisa, por exemplo. "Me identificava muito mais com o gênero masculino do que com o gênero feminino, mas foi quando a adolescência chegou que eu senti que tinha algo diferente acontecendo, eu comecei a criar um desconforto com as mudanças do meu corpo, algo que eu não esperava, não era algo que eu tinha visualizado de mim quando era criança."

Segundo Nicolas, o contato com o teatro ajudou a lidar com as questões de gênero e diversidade e permitiu que ele aprendesse mais sobre si. Foi durante uma disciplina, na qual teve que fazer um monólogo escolhendo algo que fosse político e que se tratasse de um grupo social, em que acreditasse e defendesse, que ele resolveu pesquisar mais sobre as questões de gênero. "Quando entrei em contato com a carta de um menino trans falando para os pais como ele se sentia, como queria viver, eu pensei, nossa, essa é a minha história basicamente.”

O estudante de artes cênicas lembra que foi a partir daí que passou a aceitar o que existia dentro dele, de que realmente ocorrera esse despertar e que era algo grande demais para continuar tentando se enganar ou tentar continuar escondendo, pois não tinha como esconder. "Comecei a conversar com a minha namorada sobre isso, ela foi sempre me apoiando nas ideias que tinha, em como eu me sentia, e sempre falou que queria que eu fosse feliz comigo mesmo. A partir disso, com esse estímulo externo e também interno para tomar a decisão de começar uma transição hormonal, quero ser visto como homem, tratado como homem, identificado como homem."

Aceitação de amigos e familiares
"Com meus amigos da faculdade foi algo muito fácil. Eles ficaram muito felizes em saber. E isso me deixou mais estimulado ainda a seguir em frente. Tinha tanta gente falando que isso era bom pra mim, que pensava que realmente devia ser algo bom pra mim."

Quanto à família, Nicolas disse que teve um lado que aceitou muito bem, disposto a conversas abertas sobre a questão. No outro lado da família, as coisas ficam meio escondidas, o assunto ainda é um tabu. "Todo mundo me ama muito e me respeita, mas ainda é difícil conversar sobre isso, quebrar essa barreira do vamos conversar, vamos nos entender. Acho que é isso que ainda falta."

O reconhecimento e a legislação
Nicolas já consegue usar o nome social muito bem na universidade, na chamada e em outros cadastros. "No universo acadêmico o sistema me vê, me reconhece como Nicolas e entende isso." Mesmo sabendo que essa não é a realidade de todos os trans, Nicolas se sente feliz ao contar que nos postos de saúde, assim como na área privada, ele já consegue ser chamado pelo nome social. "Fui fazer um exame de sangue numa rede privada. Ao chegar lá, disse meu nome, Nicolas, e dei meu RG com meu nome civil, já pra evitar o constrangimento de alguém me chamar pelo nome civil. No retorno ao estabelecimento, lembrei ao atendente que gostaria de ser chamado pelo nome social, e fui surpreendido com a resposta: não precisa, o nome Nicolas já consta no nosso cadastro."

Considerando o exemplo um grande avanço, Nicolas relata que as coisas estão mudando aos poucos, mas que ainda tem muito a acontecer. "As pessoas trans existem e elas não vão deixar de existir, não importa o que as pessoas tentem fazer contras as pessoas trans, não importa o quanto querem evitar que existam na sociedade, elas vão existir."

Tatiani Magalhães
Sala de Imprensa

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