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19/09/2016 - 13h15min

Documentário resgata o maior conflito armado ocorrido em terras catarinenses

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Há exatamente 100 anos, chegava oficialmente ao fim a Guerra do Contestado, considerado o terceiro maior conflito por terras da história mundial. Para marcar a data, a Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Assembleia Legislativa promoveu, na manhã desta segunda-feira (19), no Plenarinho Paulo Stuart Wright, a exibição do documentário "Contestado, a guerra desconhecida", de autoria dos jornalistas Sergio Rubim, Jurandir Camargo e Dario de Almeida Prado.
Produzido há 31 anos, o filme, de 56 minutos, é considerado ainda hoje um dos registros mais completos da guerra, que durou quatro anos e mobilizou milhares de pessoas nas terras em litígio entre Santa Catarina e Paraná.  “Trata-se de um episódio muito rico da nossa história, mas também muito sanguinário, em que cerca de 20 mil pessoas perderam suas vidas e no qual, pela primeira vez, o avião foi utilizado como instrumento de combate. Precisamos perpetuar essa história no estado e também difundi-la pelo país, onde ainda é pouco conhecida”, disse o presidente da Comissão de Educação, deputado Antônio Aguiar (PMDB).
Presente à apresentação, o deputado federal Esperidião Amin (PP-SC) também destacou a importância da obra, viabilizada no período em que era governador do Estado. “Este trabalho é muito precioso, especialmente pelos depoimentos colhidos de personagens que participaram ou testemunharam diretamente o conflito. Hoje, algo assim já não poderia ser feito, tento em vista que muitos deles já morreram.”
Representando a Associação Catarinense de Imprensa (ACI), uma das entidades promotoras da exibição, o jornalista Moacir Pereira sugeriu que o audiovisual seja modernizado e ampliado, tendo em vista o surgimento de novas técnicas de produção, e que muitas das entrevistas colhidas permanecem inéditas.
A ideia foi bem recebida pelos autores, que solicitaram ainda apoio dos parlamentares presentes para que seja viabilizado o acesso a documentos que ainda permanecem fora do alcance do público. “O Exército deve ao Estado de Santa Catarina a liberação de todos os documentos que possuem sobre o tema. Queremos saber se também há no Arquivo Público registros inéditos sobre o período, como correspondências da empresa Lumbert, relatando dificuldades nos negócios devido ao avanço da guerra", disse Jurandir Camargo.
Também participaram do evento o presidente da Academia Catarinense de Letras, Salomão Ribas Júnior, e o presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, Augusto César Pedrozo.

Guerra multifacetada
A obra expõe os fatores econômicos, políticos e geográficos que deram origem ao conflito civil ocorrido entre 1912 e 1916 na divisa entre Paraná e Santa Catarina, como a construção da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande. O empreendimento expulsou agricultores e moradores de uma faixa de quinze quilômetros de cada lado dos trilhos, doada pelo governo à companhia ferroviária. O ato de despejo deu início à Guerra do Contestado, luta empreendida pelos moradores contra o governo, as multinacionais e as oligarquias.
A proposta do documentário, segundo os idealizadores, foi recuperar uma parte da história da luta pela terra no país. “Historiadores consideram um dos três maiores conflitos pela terra da história da humanidade. Os revoltosos do Contestado não tinham um projeto de poder, era de defesa da terra”, disse Prado. “Não é confortável lembrar a história do Contestado porque o Estado foi lá, massacrou o povo e depois taxou todo mundo de bandido. Não é simples. Ainda hoje há uma concentração de terras enorme no país: 1% da população é detentora de 55% das terras agriculturáveis, usadas para projetos do grande comércio internacional de alimentos”, acrescentou.
Mesmo sendo uma das maiores revoltas populares no interior do Brasil, a Guerra do Contestado ainda é considerada pouco disseminada pela história oficial. “A ideia surgiu em 1984. Quando se falava dela, era uma coisa muito escondida, não se dava publicidade. Comecei a estudar a respeito e vi a dimensão do conflito, do movimento social. Até então, os registros da guerra eram baseados na visão dos vencedores, de que a revolta era um movimento fanático. Na verdade, chegamos à conclusão de que o fundo da questão é a luta pela terra”, contou Rubim.
A equipe de jornalistas fez um trabalho de pesquisa por dois anos, entre 1984 e 1985, para produzir o filme, com recursos do governo estadual. “Levantamos cerca de 35 mil documentos, entre materiais de arquivo, mapas, fotografias, imagens”, comentou Prado. Ao longo desse período, eles percorreram 30 mil quilômetros pelo interior do estado à procura, principalmente, de sobreviventes da guerra que aceitassem dar seu testemunho.
Na opinião dos documentaristas, os depoimentos desses personagens são o diferencial de “Contestado, a guerra desconhecida". “Entrevistamos cerca de dez sobreviventes, tanto do lado do exército, como dos revoltosos. O diferencial desse trabalho é que a história é contada pelos protagonistas da guerra, especialmente pelos vencidos”, salientou Rubim.
Os três destacaram o desafio de entrevistar pessoas que participaram da guerra. Para eles, a principal barreira era o preconceito relacionado ao episódio, caracterizado como uma guerra de fanáticos religiosos. “Nesse tipo de conflito, quem fala, geralmente, é o vencedor. Então era emocionante ouvir essas pessoas do lado dos vencidos, porque elas tinham que superar a questão de terem sido taxadas por muito tempo como bandidos da história. Na verdade, elas que tiveram que reagir a uma agressão que começa por parte do Estado”, pontuou Prado.
Os jornalistas também relataram as dificuldades técnicas para se fazer um filme naquela época. “Viajamos muito em busca de gente com 90, 100 anos de idade, no meio do mato”, lembrou Rubim. “Compramos uma câmera que hoje é uma arqueologia do vídeo, uma Sony com fita U-matic. Tínhamos que adaptar muita coisa, pois naquele período no Brasil era difícil comprar fitas, baterias”, complementou Prado. 

Memória
Além de ter recebido o prêmio especial do júri no Festival Vídeo da Terra Unicamp/Mirad de 1987, o documentário foi selecionado pela Associação Cultural Videobrasil para a exposição “Memórias Inapagáveis – Um Olhar Histórico no Acervo Videobrasil”, de 2014. Para comemorar os 30 anos de atividades, a associação fez uma seleção das 18 melhores produções consideradas "memórias inapagáveis da história da humanidade".

A última exibição pública do documentário no estado foi em 2012, em um seminário promovido pelo Ministério Público estadual e pelo Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina sobre os 100 anos do Contestado. “O nosso trabalho continua sendo uma síntese impecável da guerra. Quando a gente se envolve tão profundamente, olhar de novo, reviver, ainda é muito emocionante”, declarou Prado.

Com informações de Ludmilla Gadotti.

 

Alexandre Back
Agência AL

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